EMIGRAÇÃO E ECONOMIA
EUROPA DOS RICOS CONTRA A EUROPA DA PERIFERIA
António Justo
A União Europeia (EU)
possibilitou os investimentos nas infra-estruturas em Portugal, mas levou-nos o
nosso ganha-pão: as indústrias do calçado, dos têxteis e das pescas; a EU fê-lo
para poder vender, em contrapartida, na China máquinas e automóveis; e agora, leva-nos também, os nossos
académicos, homens e mulheres formados com o esforço da ajuda remediada dos seus
pais. Estes, que queriam ver seus filhos a subir na vida, vêem-nos agora
sair para um mundo, que nos rouba o futuro, a juventude e a massa cinzenta. A
situação é de tal modo sem sentido e sem solução que povo e nação são reduzidos
a meros espectadores da queda!
Um efeito secundário da crise é a
fuga de académicos de Portugal: segundo as estatísticas, 20% de portugueses
académicos qualificados, emigram, devido à política da austeridade sem capital
para investir. Quem ganha são os países
como a Alemanha que recebe gratuitamente uma camada social formada que vem engrossar
a sua camada média baixa que assim é rejuvenescida e cultivada. Os países
ricos com fraca natalidade concentram em si a produção sorvendo assim a
inteligência e a juventude da periferia.
A Alemanha sabe que inovação é a palavrinha
mágica que tudo transforma e dá sustentabilidade à nação. Sabe que o progresso
não anda ligado a ideologias populistas mas ao trabalho proveniente da formação
que cria inovação tecnológica e assegura assim a capacidade de concorrência no
mercado. Deixa os outros falar de justiça e de valores éticos enquanto ela faz
pela vida.
Países com Estado mas sem Soberania
A guerra dos custos (por peça) unitários do trabalho invade os Estados e arrasa-os. A
periferia vê-se obrigada a comprar e a ver deixar partir a sua juventude para
os países que ditam os preços e o andamento da economia. Aos países carenciados da zona Euro é-lhes impossibilitado o
instrumentário necessário para darem a volta à crise: precisariam de capital
disponível para investir (criar postos de trabalho) e de um euro fraco para
poderem concorrer com os seus produtos contra as potências; mas os países
ricos, com muito capital, são contra uma política de inflação e fazem tudo por
tudo para manterem um euro forte e duro que os beneficia (na EU já não se
trata de encontrar soluções mas de explorar até à última um sistema falhado). O
Banco Central Europeu (BZE) também tem seguido a política financeira dos países
do centro e norte, sendo impedido a subvencionar indirectamente os países do Sul
(compra de acções moles do sul) porque isso corresponderia a uma política de
enfraquecimento do euro (inflação). Por outro lado os Bancos privados só estão
interessados em grandes especulações (mentalidade casino) que trazem fortes
rendimentos a pouco prazo, dificultando o investimento na economia real que só
rende a longo prazo. Neste sentido os
países da periferia são obrigados a renunciar à sua soberania a favor da
ditadura económica.
Destroem a solidariedade e não
deixam margem para compromisso, dado, as lutas nacionalistas se darem na
batalha do mercado e na economia à custa de um proletariado comum desprotegido.
O povo real, que mais sofre, encontra-se
desesperado porque também sabe que com berrar e protestar não se eleva o
bem-estar. Os beneficiados do poder
económico e político, com o apoio dos Media, contentam-se em distrair o povo,
rindo cinicamente da maneira como tudo ladra no ataque, a este ou àquele
partido, a este ou àquele governo, enquanto a política e a economia se aproveitam
do barulho do seu ladrar para ir buscar o seu e o dos que ladram. O povo
não existe, é uma ficção, passou a ser uma ficção nas democracias
representativas. De facto o que existe são grupos de interesse e uma estratégia
em que os representantes se servem com uma ideologia do pensar politicamente
correcto que apenas favorece ideologias e o poder económico.
Até a Liberdade parece favorecer os Fortes
O princípio ideológico e prático europeu da livre concorrência de bens e de
circulação de pessoas, num mercado sem entraves, veio facilitar a hegemonia dos
países fortes nórdicos sobre os do sul e das classes beneficiadas sobre as
carentes (Isto é lógico porque quem desenvolve as teorias
económicas liberais e tem na mão as empresas capazes de as efectuar são eles; o
povo em geral, como a fome é tanta, não pensa com a cabeça mas apenas com o
ventre, fortalecendo assim o sistema opressor que lhe deixa as migalhas da mesa).
Os países do centro e norte
conseguem garantir a sua exportação de material caro e ao mesmo tempo, através
de imigração qualificada, resolver o seu problema de envelhecimento da sociedade.
Deste modo, os nórdicos estão sempre preparados para irem à conquista do mundo
com as suas tecnologias de ponta, enquanto os do Sul continuarão a trabalhar
para um euro forte, que os prejudica, para que a Europa continue a ser um
mercado atractivo para os mercados do grande capital mundial.
Com a emigração da geração produtiva e jovem, os países do Sul criam uma
grande hipoteca para com as gerações vindouras, dado a população activa futura
ser demasiado reduzida para poder produzir de modo a poder viver e pagar também
as reformas e pensões de uma sociedade altamente envelhecida. Não será
provável que os emigrantes então voltarão para gozar as reformas em Portugal, do
tempo que trabalharam no estrangeiro. Então os países receptores saberão elaborar
leis para impedir que o dinheiro saia dos seus países e Portugal lutará com o
problema de alimentar os seus velhinhos!
A emigração de ontem estabilizava o regime de ontem, como
a de hoje estabiliza o actual regime. “Tão ladrão é o que rouba como o que fica
à porta”! Não será que, nós, que criticamos e louvamos, somos os ladrões da
porta? Ontem como hoje as nossas vidas são a sangria duma nação entregue ao
pensar económico dos países fortes. Se no tempo de Salazar havia muita gente à
porta dos males do seu regime político, hoje não há menos à porta dos males do
nosso. Ninguém é preso por isso, ontem como hoje. Hoje há muito boa gente a
viver, e muito bem, à sombra das querelas do vizinho. Ontem como hoje todos
continuamos, mais ou menos prisioneiros do passado e do presente, perpetuados
numa mentalidade tacanha. Naturalmente, não se deve ser perfeito; sim, porque o
perfeito é inimigo do bom! Se fossemos perfeitos, coitados dos nossos vindouros
que, se interrompêssemos a velha lógica, não teriam nada para criticar e,
teriam assim, só o fim da História para declarar!...
Nós não declararemos
o fim da História mas somos os testemunhos do fim de uma grande época. Depois
da ditadura da economia e da ideologia talvez o Homem esteja maduro para se descobrir
a si mesmo!
António da Cunha Duarte Justo
Jornalista
livre e independente
www.antonio-justo.eu
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