domingo, 16 de agosto de 2015

Quanto recebe do Estado um Refugiado na Alemanha

REFUGIADOS DA VIOLÊNCIA E DA POBREZA

Por António Justo
A distinção entre “refugiados” da pobreza e refugiados da perseguição ou da discriminação é mais uma questão burocrática. Com a discussão na Alemanha sobre a diferenciação entre quem tem direito ou não a estatuto de refugiado político só se espalha ainda mais a confusão e torna-se num motivo de desculpa para políticos que se surpreendem dos resultados da sua acção política ou para conversas de café. Muitos dos refugiados do Kosovo e da Albânia e muitos outros da África fogem à pobreza ou à dureza da lei islâmica. De facto a Lei alemã, de benefícios mensais para requerentes de asilo corresponde ao ordenado mensal de um polícia no Kosovo e na Albânia: 359 euros

Segundo a lei alemão cada exilado tem direito a habitação gratuita, apoio em caso de doença e a 359 euros por mês para viver enquanto residirem em instalações de recepção inicial do Estado. Neste caso, da quantia 359 euros, 143 têm de ser dados em dinheiro (dinheiro de bolso para as necessidades pessoais) ao requerente de asilo, o respo pode ser entregue em dinheiro, em géneros ou em senhas. No caso de casais, cada parceiro recebe 129 euros mensais e se tiver outros familiares a viver com eles, recebe cada um deles 113€, se forem crianças recebem entre 85 e 92 euros. Quando deixam de viver nas instalações de recepção do Estado as entidades locais assumem os custos de habitação e pagam 216 euros para agregados com uma só pessoa; crianças e outros membros do agregado familiar recebem entre 133 € e 194 € cada.

Os refugiados que se encontrem na Alemanha passam depois de 15 meses a receber 392 €, isto é o correspondente aos benefícios sociais ao nível da assistência social, dos alemães.

Segundo as estatísticas alemãs, de Janeiro até 30 de Junho de 2015, foram feitos 159.927 pedidos iniciais de asilo que se distribuem pelos seguintes países de origem: 32.472 (o que corresponde a 20,3%) da Síria e da República Árabe, 28.672 (17,9%) vêm do Kosovo, 21.806 (13,6%) da Albânia, 10.126 (6,3%) da Sérvia, 8.331 (5,r%) do Iraque, 7.932 (5,0%) do Afeganistão, 4.182 (2,6%) da Macedónia, 3.582 (2,2%) da Eritreia, 2.805 (1,8%) da Nigéria, 2.701 (1,7%) do Paquistão e 37.318 (23,4%) de outros países. (Cf: https://www.bamf.de/SharedDocs/Anlagen/DE/Downloads/Infothek/Statistik/Asyl/statistik-anlage-teil-4-aktuelle-zahlen-zu-asyl.pdf?__blob=publicationFile)

Atendendo ao agravar-se da situação, os estados alemães avaliam, até ao final de 2015, entre 300.000 e 550.000 o número de requerentes a asilo na Alemanha.

Um refugiado do Kosovo ou da Síria não pode ser discriminado, devido à dignidade humana, independentemente se o movem motivos de ser perseguido ou de mera pobreza.

Como se vê os pretendentes ao direito de refugiados têm, a nível económico, no máximo o estatuto de pobres na Alemanha. Muitos deles para poderem chegar até cá, têm de pagar vários milhares de euros a transportadores ilegais, pondo a sua vista em risco como se constata pelas mortes no Mediterrâneo.

Na verdade o nosso bem-estar na Europa e na América do Norte começa a ter o seu preço directo pois tem havido muita gente que se priva para que possamos viver melhor.

A ajuda aos refugiados é uma correspondente compensação ao que ontem aconteceu e hoje acontece nas regiões da sua proveniência. Como o euro não chega a eles então eles têm de se chegar a ele. Atrás de si ficam cidades e aldeias onde o bem-estar não chegou.

Os políticos europeus chegaram ao fim do seu latim depois de tanta guerra-guerrilha que, directa ou indirectamente, fizeram ou apoiaram com os Americanos, desde o Afeganistão, Iraque, Líbia, Síria, até à Sérvia e à Ucrânia e o povo sente-se agora desconsolado. Agora já é tarde para se queixarem da chegada de tantos refugiados da barbaridade e da miséria.

O facto é que quem faz o negócio com as armas não pode ficar ileso; porém para fugirem com o rabo à seringa, falam da necessidade de uma distribuição “solidária” dos que procuram asilo por toda a Europa, quando apenas alguns países espalham a miséria naquelas regiões através das armas que vendem e do dinheiro que suas firmas ganham depois com a reconstrução dos países destruídos.

Com a vinda de tanta gente jovem para a Europa com a população tão envelhecida, o dinheiro que agora emprega nos refugiados é um empreendimento de rejuvenescimento. O único problema virá dos muçulmanos, não como indivíduos mas como grupo que, de uma maneira geral, não se tem integrado, tendo marcado a sua presença mais pela contra-afirmação em relação à cultura acolhedora. Só na Alemanha foram presos 1.500 traficantes de refugiados em 2015.


António da Cunha Duarte Justo
Jornalista
In Pegadas do Tempo www.antonio-justo.eu

quarta-feira, 12 de agosto de 2015

NA FÁBRICA DAS DÍVIDAS E DA CULTURA CORPORATIVA

 O Estado Purgatório Frisador de uma Igualdade que promete o Paraíso

Por António Justo
Passamos de uma economia, em que trabalho e produto se regulavam através da troca com dinheiro (capital), para a nova economia, a economia financeira do endividamento. O sociólogo e filósofo Maurizio Lazzarato, autor de "La fabrique de l'homme endetté", analisa com perícia a crise do endividamento actual. A essência do capitalismo liberal é viver da dívida individual e estatal e para optimizar o seu lucro serve-se dos cortes na Segurança Social terceirizando os custos sociais apenas no pequeno empresário, no trabalhador e no contribuinte.

Para Lazzarato o “homo debitor”passa a ser a nova criação do homo economicus. "Passa a não haver direito a uma habitação, mas a um crédito para habitação (hipoteca), já não há direito à educação, mas - especialmente no modelo anglo-saxão - pede-se dinheiro emprestado para financiar os estudos." Assim o estudante, no final do curso, com o futuro hipotecado passa a não ter problemas de divagações metafísicas ou ideias que o poderiam torna inseguro num caminho já predeterminado.

De facto, esta é a ideia da nova economia da Califórnia propagada por representantes do "Silicon Valley". País moderno ou pessoa cliente procura viver o presente, num presente alegre mas fiado, à custa do futuro.

A ideologia do “Vale do Silício” serve-se do conceito de progresso na sequência da “racionalidade secular cristã” e da fé no além. Pretende criar uma maneira de ser e de estar baseada no capital com a consequente relação tipo credor-devedor… Substitui a culpa pela dívida, o paraíso pelo proveito e no caso de surgirem complicações cai-se no inferno da falência. O Estado passa a ser o Purgatório, aquele lugar de purgação que pretende acabar com as diferenças, colocando todos (trabalhadores, desempregados, produtores e consumidores) na plataforma de devedores ou dependentes. Os Governos perdem o brilho da soberania e a democracia é ensombrada pelas asas negras de diferentes demónios interessados apenas na radiografia da alma do credor através do ecrã do cartão de crédito.

O Adão moderno, anda sempre a caminho, com a dívida à frente; esta é companheira e justifica algum benefício já gozado no crédito do passado e nas vantagens de um viver presente que um novo crédito proporciona.

Todos se inculpam no capital onde buscam o crédito. Os riscos do novo “crente” são de responsabilidade limitada ao indivíduo cliente. O antigo pecado original que deu origem à economia social passa assim a uma economia das dívidas. A perversidade da nova crença económica está no facto de se transformar dinheiro em dívidas e dívidas em posse. O credor anónimo tem um poder mágico sobre o devedor. A dívida tem um efeito pedagógico e domesticador. Passamos a uma situação de leasing onde tudo é arrendado. 

A economia do endividamento já não honra o trabalho nem considera o trabalhador; deixa-se a relação produtor-produto, para se passar à relação credor-devedor. Ao mesmo tempo tenho a impressão de nos encontrarmos numa época muito bela e rica mas que terá de estar atenta ao risco de reduzir a pessoa a indivíduo cliente e a sociedade a um grande mercado de meros indivíduos de personalidade tábula rasa.

O Estado Grego é um exemplo da nova matriz em via no mundo ocidental. Todos os Estados Europeus eternizam a dívida, de facto impagável, mas criam uma forma de viver aparentemente mais leve e livre, sem perguntar - à custa do quê e de quem? A racionalidade de cima (conhecimento tecnocientífico) ordena a irracionalidade de baixo (o proletariado). Alia-se o capitalismo cultural ao marxismo cultural. Viver passa a significar mais ter que ser.

O livro “A fábrica do homem endividado” de Maurizio Lazzarato questiona inteligentemente o sistema económico-financeiro actual mas não deixa propostas para nos desfazermos das dívidas. Para Lazzarato a melhor maneira de o devedor se livrar do sistema seria criar uma nova inocência segundo a qual os Estados não pagariam a dívida nem tomariam em conta a moral.

O capitalismo liberal e o marxismo cultural servem-se do Estado com Purgatório frisador da igualdade que promete o paraíso das boas intenções mas esconde o inferno delas cheio.

António da Cunha Duarte Justo
Teólogo e pedagogo
In Pegadas do Tempo www.antonio-justo.eu

sexta-feira, 7 de agosto de 2015

A Multipersonalidade de Pessoa e as Identidades digitais

OS RISCOS DO CRENTE AD HOC COM UMA IDENTIDADE INTERNET
A Caminho de um Estado Polícia e de uma Sociedade de Monopólios?

Por António Justo
Portugal pioneiro na Aplicação digital
Os dados biométricos dos bilhetes de identidade, encontram-se especialmente desprotegidos em Portugal por reunirem no Cartão do Cidadão o número de identificação civil, os dados de acesso à conta de saúde e os dados da Repartição de Finanças. Estes dados podem ainda ser complementados pela ligação da conta bancária às finanças, reunindo assim os pressupostos para a realização de um Estado Polícia.

O indivíduo ao ver o Bilhete de Identidade substituído pelo Cartão do Cidadão, com a possibilidade de interconexão dos dados, passa a ter uma outra plataforma de identidade de caracter meramente funcional. Portugal encontra-se a nível técnico na vanguarda da Europa dando a impressão de ser a cobaia para posteriores aplicações nos outros países da União Europeia que recolhem dados mas de maneira mais discreta devido à discussão pública do cidadão.

A Microfísica do Poder

O tecto metafísico que tem regulado as normas de comportamento da sociedade ocidental revela-se demasiado exigente para uma sociedade de vida ad hoc. À regulamentação religiosa segue-se a regulamentação política que tenta, em nome de valores convencionados, criar um tecto legislativo e uma rede digital que proteja a sociedade dos abusos da liberdade individual. À medida que o autocontrolo ético e moral de caracter espiritual se esvai, aumenta o controlo externo do foro penal estatal. A desresponsabilização e a despersonalização em via levam o indivíduo a prescindir de elementos de identificação baseados em deidades e em espiritualidades para centrar a sua acção numa ética da concorrência de luta livre pela vida. Passa-se do homo faber que vivia do trabalho com o suor do seu rosto para o homo economicus liberto da culpa mas subjugado à dívida. Nesta sociedade de transição, o homo economicus prescindirá, ocasionalmente, de muitos dos elementos de identidade porque o âmago da sua alma se encontra identificado no Chip (microplaqueta) do Cartão Multibanco.

No Cartão do cidadão e na conta Google encontra-se já simbolizada a “microfísica do poder”.

A Multipersonalidade de Pessoa e as Identidades digitais

Quem viaja nos mundos de Fernando Pessoa encontra-se já no âmago da era da transição em via. O magnífico poeta futurista Fernando Pessoa procede ao desdobramento do “eu” fazendo-o corresponder a diferentes identidades. Ele confirma: “Multipliquei-me para me sentir, Para me sentir, precisei sentir tudo,… E há em cada canto da minha alma um altar a um deus diferente...”

Fernando Pessoa, um vate para iniciados, é a expressão da fé moderna que exercita cedo o alargamento da sua Identidade nos Heterónimos e que hoje se constata no originar-se de identidades digitais. A internet torna-se como na continuação da sua literatura.

A transmissão e circulação de dados possibilitam também, a nível individual (User) a criação de "identidades digitais". O User (utilizador) na qualidade de receptor e emissor, tal como acontece em literatura, pode proceder ao alargamento da sua imagem. O mesmo indivíduo cria diferentes papéis e personagens à imagem de Fernando Pessoa com os seus heterónimos (Alberto Caeiro, Ricardo Reis, Álvaro de Campos) que apontam para a pós-modernidade. A Rede (Net) pressupõe a possibilidade de criar novos perfis ou de modificar uma sua imagem já existente.

Os instrumentos digitais facilitam a melhor acomodação ao ambiente e possibilitam uma formação mais abrangente com aprendizagens mais rápidas e a formação de um pensar mais diversificado. Tudo isto tem as suas consequências na formação de uma nova identidade. Esta mover-se-á mais entre virtualidade e realidade entre aldeia e mundo, criando a ilusão da identificação de indivíduo-casa-aldeia-mundo com um outro estilo de vida e uma nova convivência. Da aldeia o usuário, através da janela do seu computador, tem a sensação não só de ter o mundo em casa como também a intuição de ser mundo. A sua individualidade acompanha as linhas do seu horizonte que se desloca no sentido global.

A autopromoção digital através da rede acontece num surfar ("Surfing") que faz lembrar um discurso literário com diferentes metáforas e jogos que dão asas à fantasia e criam a ilusão de descorporização e da ampliação dos próprios contornos na construção de uma nova identidade que se encontra em processo entre o virtual e o real.
À deslocação do foco do Horizonte segue-se a deslocação ("glocalização") das próprias periferias, criando-se novos espaços virtuais, numa imitação da realidade a que se segue a criação de uma nova realidade.

Investigações no campo dos jogos virtuais e de outras potencialidades da Internet chegam à conclusão que o utilizador (User) cria em si uma certa anonimidade através da ausência do corpo, de apelidos (Nicknames), de confraternizações no jogo, da possibilidade de mudar de género e da comunicação com todo o mundo. Isto cria nele uma vivência especial e a formação de um novo desenho da própria ipseidade. A nova personalidade torna-se dependente do real e do virtual e a percepção do real e do virtual passa a resultar da dependência da interação da noção de virtualidade e de realidade.
A obcecação pela tecnologia e pela digitalização

A obsessão pela tecnologia e pela digitalização de tudo torna fatal o optimismo do progresso pelo facto de querer realizar tudo o que seja possível, como se vê na doutrina do centro do poder do séc. XXI em acção a partir do Silicon Valley. A experiência milenária mostra que à concentração do poder se segue o abuso de poder. O objectivo de se querer um mundo melhor não justifica o uso de todos os meios e, especialmente, quando os seus líderes não aceitam correctivos e não se importam com as infraestruturas da sociedade e da pessoa. Precisa-se da fomentação de um sistema em que as pessoas participem, de maneira a resolverem os verdadeiros problemas da natureza (ecologia) e da humanidade (paz, amor e justiça).

De facto o que se encontra no centro dos interesses é o dinheiro e o poder; a mudança da sociedade e do mundo acontece como aspecto colateral ou por acréscimo. Assim, o progresso não pode tornar-se num regresso à imaturidade. Aqui põe-se a questão de quem fomenta e quem controla.

Vivemos num período de transição em que também a controvérsia se torna produtiva. Dave Eggers resume no seu livro “The Circle” os aspectos negativos da sociedade virtual preocupada em se encaixar no sistema e para melhor realizar o seu papel perde de vista o que realmente está a acontecer em todos os sectores da sociedade. As fábricas do pensamento criam realidades de facto como as do Vale do Silício (Google,etc.) e só passados tempos se reflecte sobre a situação criada e eventuais problemas a ela ligados. Como comentadores encontramo-nos numa luta perene atrás da desgraça e do medo mas com a satisfação de o fazer para que não haja tantas vítimas do silêncio. Conscientes de que o centro dos interesses é o dinheiro e o poder, importa com o nosso contributo não contribuir para o ruído seja ele em termos de crítica ou de aplauso, de que tão bem tem vivido o mundo do poder e do dinheiro rindo-se da caravana barulhenta que passa enquanto eles ficam.

O romance “The Circle” de Dave Eggers, adverte para a visão de uma sociedade-Internet; nela a virtualização global e a transparência exigidas por organizações globais contradiz a liberdade e a dignidade do cidadão. A IT (Vale do Silício), segundo a visão pessimista do romance, quer dotar cada um e toda a população com uma única identidade: a identidade de transparência Internet que facilita o controlo global. O “Círculo” é uma superpotência Internet, maior e mais radical que todas as empresas até agora existentes. O círculo, como coleccionador de dados pessoais, servindo-se da transparência e da rede sabe mais sobre um indivíduo que ele mesmo.

O busílis da questão, na procura de uma solução que dê continuidade ao progresso e ao mesmo tempo se preserve a dignidade da pessoa, situa-se no facto da cedência dos próprios dados proporcionar benefícios aos que os cedem mesmo com o risco de se abusar deles. O marketing digital usa e abusa das técnicas psicológicas de Pavlov que constam de incentivos e recompensas: se quero ter acesso a uma página de internet, o irmãozão Google só me permite tal gosto se deixar lá os meus dados pessoais. Prémio e castigo constituem os fatores do triunfo do marketing digital.

É porém consolador saber que o futuro continua a depender de cada pessoa e que esta não pode ser reduzida à consciência que tem do tempo.

 O preço que todos estamos a pagar por tantas facilidades é a liberdade do indivíduo, o direito à comunidade e a opção de não ter de fazer o que outros querem. A alta tecnologia do Vale do Silício determina o futuro sem que a política se pronuncie sobre ela e o cidadão pensa que pensa ao falar dos defeitos e das virtudes dela, quando com isso, se não interfere, segue é os interesses dela.

Consequentemente haverá que dar mais valor ao entendimento de que a privacidade é um direito humano inalienável.
Sigo a reflexão no próximo artigo “NA FÁBRICA DAS DÍVIDAS E DA CULTURA CORPORATIVA”
António da Cunha Duarte Justo
Teólogo e pedagogo
In Pegadas do Tempo www.antonio-justo.eu

quarta-feira, 5 de agosto de 2015

500 € DE MULTA PARA CRIANÇAS MENDICANTES

O Senado de Berlim planeia elaborar um regulamento contra o abuso de menores proibindo a mendigação a crianças menores de 14 anos. Uma infracção ao regulamento será penalizada com multa até 500 euros. Em Bremen, Munique e Viena já há legislação semelhante.

Por vezes vêem-se ciganos com crianças a mendigar nas ruas, mesmo no tempo das aulas. De facto encontram-se, em muitas regiões, mães com crianças nas ruas, à frente de igrejas, supermercados, etc. A cultura cigana tem a tradição de mendigar. Na Alemanha vivem entre 80 e 140 mil ciganos (Roma); em Portugal calcula-se entre 30.000 e os 90.000 ciganos portugueses. Uma criança pedinte provoca mais compaixão do que um adulto; o emprego de crianças (e até de animais) torna mais eficiente o peditório. Crianças são assim, muitas vezes, instrumentalizados e impedidas de ir à escola. O bem da criança, na perspectiva da ordem social maioritária, é posto assim em perigo.

Há funcionários em algumas cidades que recomendam não dar esmolas a crianças para que estas não sejam exploradas.

Crianças ciganas apresentam taxas elevadas de insucesso e absentismo escolar (especialmente de meninas) devido à própria mentalidade cultural e ao etnocentrismo escolar da comunidade acolhedora  não adaptado a diferentes formas de viver. De notar que há muitas famílias ciganas bem integradas na sociedade maioritária.

Torna-se difícil avaliar e falar de situações de pessoas que vivem à margem da sociedade maioritária, sejam elas ciganas, os sem-abrigo, moradores de rua, etc.. O mesmo se diga da suficiência da previdência social a que podem recorrer. Tudo isto não é fácil dado não se poder proibir a pobreza nem ser possível a existência de um sistema exemplar aceite por todos.
António da Cunha Duarte Justo
www.antonio-justo.eu

segunda-feira, 3 de agosto de 2015

CULTURA DA MUDANÇA ENTRE SONHO E LIBERDADE

A alta tecnologia promete sonho mas consome liberdade – Tudo e todos têm de mudar

Por António Justo
Encontramo-nos num processo de desenvolvimento em que o pensar linear será substituído pelo global e em que consequentemente as visões da realidade a-perspectiva substituirão paulatinamente as actuais visões e equacionamentos lineares da realidade. Passaremos do tenho razão para o temos razão, atendendo à consciencialização da complementaridade dos diferentes biótopos da natureza, da complementaridade dos diferentes biótopos culturais e da complementaridade dos diferentes sistemas de pensamento e à fragilidade da formação da opinião regulada por monopólios globais. A estratégia que se encontra por trás desta mundivisão aproxima também a linguagem e metáforas de mitos e religiões às expressões e concepções científicas.

Iphone, automóveis com propulsão própria, drones usados no comércio como serviço de entrega, robôs inteligentes, etc. parecem substituir cada vez mais o Homem reduzindo-o ao papel de espectador. A alta tecnologia promete o sonho à custa da liberdade. O exercício do pensamento passa para os computadores e a força revolucionária parece ter passado para a técnica e o trabalho manual é cada vez mais substituído pela produção mecânica. Tudo isto está a provocar uma mudança radical das nossas impostações éticas, da nossa maneira de pensar e agir. É o que se observa e sente hoje que nos encontramos em pleno epicentro da revolução Vale do Cilício: uma revolução que quer tornar possível a felicidade individual realizada através dos padrões de grandes monopólios anónimos à margem de democracias, das culturas e das religiões. Aristóteles diria hoje em termos portugueses: ”nem tanto ao mar nem tanto à terra”.

Aos industriais e aos barões do petróleo sucederam-se os Bancos e os Gestores de fundos Hedge. Actualmente encontra-se em via de realização a era da revolução digital – com os génios dos computadores e das altas tecnologias.

Antes os líderes contentavam-se com o poder da riqueza depois passou-se ao poder do dinheiro. Hoje os líderes do mundo (protótipo Silicon Valley na Califórnia) querem mais; aspiram a determinar não só o que consumimos mas também a maneira como consumismos e como vivemos juntando na mesma mão (ou organização) o ideário, a economia, a ideologia e a produção numa Agenda bem definida. A nova ideologia-praxia é tentadora porque sabe empregar também a linguagem e as metáforas das religiões e das literaturas.

Religiões e outras instituições abertas aos sinais dos tempos terão de estar atentas às suas estratégias! Delas poderão aprender muito em termos de resposta ao globalismo.

No princípio era a fé em Deus, depois veio a fé no dinheiro e agora experimenta-se a fé na mensagem da Alta Tecnologia como doutrina de salvação, que transfere a esperança para a perspectiva das possibilidades infinitas da tecnologia! (Já há pessoas que se deixam congelar para serem descongeladas na altura em que a técnica tenha descoberto soluções para a morte – uma ilusão que desconhece a realidade do ser criado ou da matéria mas que como utopia dá resposta, à sua maneira, a necessidades do ser humano). Para os apóstolos da nova mensagem, os estados, as religiões, as filosofias tornam-se em empecilhos de progresso. Fixados na sua filosofia que de forma eclética se serve da ciência e da religião como expressão da necessidade humana, elaboram um sistema de ortodoxo-praxia orientada pelo desejo criativo que se realiza na inovação. Reduz-se o ser a uma determinada forma de estar na vida. A ideologia substitui cada vez mais as soluções práticas passando muitos projectos a ser efectuados segundo os óculos da ideologia e do momento.

No princípio era a fé em Deus que se encontrava no âmago do Homem. Hoje é a fé na tecnologia que já não se encontra dentro do homem, dependendo só dele e ao não fazer parte do seu centro corre perigo de o alienar totalmente.

A filosofia da alta tecnologia (economia digital) incorpora nela também Marx e Engels definindo o alienante como aquilo que nos tira do tempo, do concreto; assim se reduz a pessoa à materialidade que se esgota na actividade produtiva que é ao mesmo tempo fonte da consciência; por outro lado considera a religião, Deus e o dinheiro como factores alienantes que nos desviam da realidade material. A nova fé encontra no Joga e em exercícios semelhantes uma maneira de estar prática e de subjugar instâncias metafísicas.

A nova alienação prende a consciência humana à sua mera actividade. O produto é a luz da vela que resulta da energia do trabalho e o indivíduo esvai-se nela. A ideologia moderna, que a todos parece iluminar, aliena-nos com produtos conseguidos à custa da desumanização das pessoas reduzidas a mercadoria numa “metafísica” bruta construída, como no caso da vela, a partir da relação produto-consumidor. Aqui dá-se a identificação do indivíduo com o seu destino; tudo é reduzido a indivíduo saído da materialidade para se consumir na materialidade. A promessa do desenvolvimento infinito alimenta a nova alienação do indivíduo que ao ser reduzido a produto passa a ser consumido na ilusão do que consome. A relação entre produtor-produto e consumidor passa a ser a utilização, o imediato. A teoria da alienação em Marx, para ser consequente reduziria o Homem a mera biologia animal irracional. De facto, o pensamento, na sua qualidade de abstracto, seria na sua essência uma alienação. Para ser consequente o pensamento marxista e da aliança capitalismo-marxismo teriam então de declarar o fim do pensamento.
 Continua no próximo artigo sob o título “O VALE DO SILÍCIO (Silicon Valley) E A ESCOLA DE SAGRES – MITOS DA SUSTENTABILIDADE”
António da Cunha Duarte Justo
In Pegadas do Tempo www.antónio-justo.eu