Antigamente acreditava-se e hoje crê-se saber
António Justo
Cada sociedade, época ou pessoa
tem a sua moldura de pensamento a valorizar o que abraça e inclui. Por vezes, o
Zeit Geist opera como um tufão que tudo arrasta. Valores e convicções são submetidos
à régua da moda que só conhece o certo e o errado (o que está dentro ou fora do
seu caixilho), sem espaço para discordar nem para reciclar ideias. “Uma
comunidade incapaz de lidar com o desacordo está mal preparada para o futuro”,
constatava Timothy Radcliffe.
O Politicamente correcto é uma maneira de ser e de pensar adaptada a uma
mundivisão do oportuno, a uma determinada ideologia ou sociedade que amarra o
pensamento, a moral e a atitude aos próprios limites, sejam eles científicos,
partidários, religiosos ou políticos. Quem se atreve a ter opinião diferente ou
a pensar com a própria cabeça é, geralmente, visto como espanta pardais ou é
colocado no rol de persona non grata. Zelotas da opinião só aceitam ideias
extremas progressistas ou tradicionalistas. Desaprendeu-se a regra de ouro de
Aristóteles de que a virtude se encontra no meio e como tal a regra constitui
uma exigência a descer temporariamente do próprio miradouro para se abranger
também outras paisagens.
Pessoas que seguem o
politicamente correcto são, geralmente, simpáticas, conformes e conformistas;
há as oportunas, alinhadas e consequentes, que aceitam tudo e estão de acordo
com tudo (também não ouvem nem escutam, o que lhes seja adversário ou crítico; outras,
satisfeitas, não precisam de tomar nada em conta, é mais fácil e cómodo excluir
do que envolver-se); também as há distraídas com o pequeno defeito de se
tornarem intolerantes para com pensares e opiniões diferentes ou não alinhadas
à sua manada. Nos dois grupos delineia-se um denominador comum: tudo o que vem à
rede é peixe.
Quer-se a igualdade mas por medo
à diferença. Querem-se as pessoas todas citadinas e bem-educadas, não por amor
à virtude mas por vergonha da província. Mas, no fim de contas, o problema não
é da cidade nem da província mas sim um erro de pensamento: parecer que não
cheire ao humos do próprio curral provoca medo ou agressão pelo facto de ser
desconhecido ou diferente.
Vive-se num tempo hipócrita em
que a crítica a velhos dogmatismos serve de subterfúgio para esconder a própria
moralina e os dogmatismos do novo pensar conforme, da correcção civil e do
género. Já Platão observava: “Muitos odeiam a tirania apenas para que possam estabelecer
a sua”.
No panorama das opiniões, domina
o vermelho e o rosa de um pôr-do-sol de estação outonal, já sem forças para
contradizer o pensar dominante. É como nas autoestradas, o que importa é o
sentido e a liberdade na aceleração.
A violência vivida e encenada
substitui a realidade pelo debate. Assiste-se a uma conivência solidária e
significante em que o medo e a infelicidade se irmanam numa emoção comum. Não
interessa a coisa em si, o que dá sustento é a opinião.
Por fim surge o mecanismo da
consternação que é movido e cultivado por um jornalismo de caracter político e
comercial, interessado mais na lágrima que na acção. As pessoas são
condicionadas ao papel de espectadores ou de eleitores que podem escolher,
livres para escolher o que se lhe põe à frente através do ecrã da democracia.
O pensar politicamente correcto
impede a liberdade de pensar diferente. O pensar diferente, ou até alternativo,
não cabe no uniforme da política nem no credo dos meios de comunicação social.
George Bernard Shaw dizia: “As
pessoas razoáveis adaptam-se ao mundo. Pessoas irracionais adaptam o mundo a si
mesmas. Portanto, todo o progresso depende das pessoas irracionais. “
António da Cunha Duarte Justo
Teólogo e Pedagogo
www.anonio-justo.eu
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