41% dos
portugueses querem voto obrigatório nas eleições
António Justo
Segundo uma investigação do Expresso (1),
41% dos portugueses querem voto
obrigatório: um verdadeiro testemunho de pobreza para o sistema partidário! A concretização
de tal ideia significaria um voto de desconfiança nos partidos e de frustração
dos votantes, preocupados agora em preservar o estatuto de um Estado
democrático. Com efeito, se a abstenção
atingisse os 50%, a governação democrática deixaria de ser legitimada (nas
últimas legislativas, a taxa
de abstenção oficial foi de 44,1%).
Segundo o mesmo Expresso, a filiação
partidária entre 2000 e 2014, diminui de 63 mil filiados (menos 18%). O PCP em 2016 tinha 54 mil filiados, o PS 91 mil em 2014, o
BE 9 mil em 2014, o PSD 103 mil atualmente e o CDS conta com 35 mil filiados.
A “abstenção e o desinteresse dos cidadãos”
a ser combatidos pela obrigação de voto viria a justificar ainda mais a
irresponsabilidade da classe política. Esta sentir-se-ia confirmada e sem
necessidade de inovação aproveitar-se-ia de uma cidadania confirmadamente fraca,
própria de uma sociedade desintegrada só em parte agalinhada sob clubes e
partidos.
Como se observa, cada vez convence menos a
dança ao ritmo da música de Bruxelas e a dança em torno das ideologias de
extrema esquerda que gastam todo o seu gás em polir a própria imagem e em securitizar
o próprio credo e em responsabilizar Bruxelas por todas as incúrias portuguesas…
Num Portugal só com extrema esquerda, sem
extrema direita e com a dificuldade do PSD, CDS e PS na concorrência em torno
do mesmo centro de esquerda-direita, é favorecida a formação de agrupamentos liberais
à esquerda do PS (com excepção do PC dogmático); esta situação impede a formação
de um partido moderado que neutralize o sistema de alternância governamental. Por
outro lado, os partidos de esquerda e de direita têm sido muito integristas,
fomentado públicos entrincheirados, mais agarrados a convicções que a
argumentos.
A disputa entre Rui Rio e Santana Lopes é sintomática da centralização política
no centro que revela o enquadramento português de uma luta de perfilação condicionada
à aproximação de Rio de um PS que conseguiu os aliados da extrema esquerda para
governar e de Santana Lopes que tentará tirar
votantes do partido (CDS) que se tem mantido mais competente em questões de
identidade cultural e também votos de socialistas descontentes.
Por toda a Europa os partidos menosprezaram os problemas do dia-a-dia da população
e por isso começam a surgir novas formações políticas a tentar ocupar aquele vácuo.
Em Portugal, um povo não tanto exposto às ventanias dos tempos, os partidos assenhorearam-se
mais facilmente do pensar político. São os mandatários da Constituição, mas não
estão ainda à altura de realizar a missão a eles confiada, em função do Estado
e da sociedade.
Os partidos, no seu encargo constitucional
de contribuir para a formação cívica do povo, têm falhado redondamente: mais
que centrarem uma discussão pública em argumentos e na análise concreta de
factos e políticas, a sociedade é dirigida no sentido das corporações dos irmãos,
dos amigos, dos camaradas, etc. e como tal tendente a canalizar o autoritarismo
de que vivem para a sociedade fomentando a formar posições jacobinas e opiniões
estanques (o calor afectivo chega a perturbar a lucidez mental). Deste modo
perpetua-se ad eternum uma mentalidade do “eu quero, posso e mando”, incapaz de
autoanálise para reconhecer o bem que também o adversário tem, porque o mais
importante é a coisa em si e não a afectividade defensora do próprio clube. Uma
discussão pública mais partidária que política tem levado grande parte da população
(52%) a desinteressar-se da discussão política e a limitar-se ao discurso
familiar ou de futebol.
Cada regime está empenhado em colocar as suas viseiras na sociedade: isso
foi o que fez Salazar e o que fez e faz o regime de Abril. O preço que o Estado português e a democracia têm pago
pela sua classe política não se tem mostrado rentável para o país: entre os
regimes económicos e democráticos parceiros, o país vai seguindo na cauda da União
Europeia, quase ao nível da Grécia como nos tempos do Estado Novo (embora então
tivesse de manter uma guerra).
A diabolização do regime de Salazar está para o branqueamento do actual
regime como a diabolização do regime de abril está para o branqueamento de
Salazar. O mesmo fenómeno se manifesta na respectiva diabolização ou
branqueamento nos partidos.
O amanho de uma tal cultura política terá como resultado a produção de clientelas
consumistas mas sem rosto próprio!
António da Cunha Duarte Justo
Pegadas do Tempo, http://antonio-justo.eu/?p=4613
(1)
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