segunda-feira, 22 de fevereiro de 2016

HUMBERTO DELGADO UM DIPLOMATA QUE ESCREVIA “RREPÚBLICA” COM DOIS R



“Quais são os maiores pulhas e hipócritas? Os Monárquicos ou os Republicanos?” O Governo ou a Oposição?

Por António Justo
Humberto Delgado fundamenta, no seu livro “Da Pulhice do Homo sapiens – Da Monarquia de vigaristas pela República de bandidos à Ditadura de papa”, de maneira realista e profética a razão do contínuo adiamento do desenvolvimento de Portugal e da sua governação.

Humberto Delgado fala da “República tuberculosa de nascença”. Escreve República com dois R, esclarecendo: “RRepública” com dois R, em que um é dos roubos”. “Nihil sub sole novum” (Ecl. 1:9)!”

Recomendaria a leitura deste livro a todos, especialmente a quem quer compreender as razões da corrupção do Estado e da nossa “revolução” (coloco o link com o livro em nota (1 e 2). A sua leitura poderá esclarecer a razão porque o regime de Abril fomentou uma atitude fanática republicana na avaliação tanto do regime de Salazar como do regime do 25 de Abril. 

Cidadãos que sentem as dores de um Portugal devidas à sua oligarquia decadente, tal como os emigrantes, que não se serviram nem foram servidos por nenhum dos regimes ou governos, bem como uma nova juventude, serão os que melhor poderão compreender e sentir a razão de um Humberto Delgado amargurado e furioso por amor à nação. 

Humberto Delgado – A Voz de um Profeta no Descampado da Nação

A linguagem que Humberto usa não se distingue da que encontramos hoje nos meios sociais. A razão do seu escrever não se distingue da do nosso escrever e que ele bem resume: ”É esse patriotismo, ferido por ver a gente que compõe o pseudo-escol do meu país, quem escreve este livro, raivoso por se sentir impotente para a liquidar”. Diria: raivoso por verificar o beco sem saída a que as nossas elites nos conduzem e a um dissabor na nossa consciência por aguentar a desonra.

Como se fosse hoje, fala da “canalha política que salva o país nos cafés e nos ministérios”. Do rei D. Carlos diz: “O rei, um rei constitucional, que afinal pouco mais é que um objecto de adorno… com muita medalha, figurava como culpado dos males nacionais desde a chuva abundante à seca mortífera”. 

Da cumplicidade entre conservadores e progressistas, diz: “A política dos partidos monárquicos resumia-se a isto: “escalar o poder, para satisfazer a vaidade ou para comer…”. Fala da “canalha progressista” e do espírito anticatólico referindo: “Dias Ferreira estadista dos mais sérios da monarquia dizia: ’À frente dos negócios públicos em Portugal têm estado verdadeiras quadrilhas de ladrões.’ “Vê o leitor o que era a administração dos políticos monárquicos. A da república foi idêntica”… “É do domínio público a fobia que se criou pelas missões católicas, dado o espírito intolerante dos que se dizem republicanos, como se fizesse algum mal que o preto aprendesse a carpinteiro, a ler e a adorar a Deus… Pois apareceram as missões laicas, e todos sabem o que foram, pretexto de embarque de todo o malandro e prostitutas, para as colónias.” Humberto Delgado hoje em vez de dizer monárquicos e republicanos diria: esquerda e direita, governo e oposição.

Ontem como hoje o servilismo ao estrangeiro frutificam em nome da crise ou do internacionalismo e de um progressismo simplicista e barato que substitui o grande ideal civilizacional intercultural por correntes ideológicas. Humberto Delgado critica também os políticos republicanos e monárquicos que “puseram a sua pena ao serviço da causa da União Ibérica” pondo neste rol Passos Manuel, Teófilo Braga, Oliveira Martins e Antero de Quental que em “Portugal perante a revolução de Espanha” defende: “Nas nossas actuais circunstâncias o único acto lógico e possível de patriotismo consiste em renegar a nacionalidade”.
 
Por aqui se pode compreender melhor o interesse dos heróis da descolonização de Abril 74 no sentido da desmoralização e da desnacionalização do povo português e a pressa em inculcar bezerros de ouro contra uma fé antiga que estaria aberta à novidade. Na primeira república como no 25 de Abril o que dominava era a ideologia e os interesses individuais, que não a coisa pública. 

“O portuguesinho só quer direitos, honrarias, pergaminhos; mas deveres? – Isso, trabalho é bom para o preto”. Com o 25 de Abril repetiu-se o que já se fez no início da república (e na revolução de 1820 como se tratasse de criar uma nova civilização), deu-se então cabo das escolas industriais porque só se queria uma república igual de meninos de liceu: “Em resumo, cada um fazia o que queria.Pois bem: proclama-se a república; e então passa a ser assunto obrigatório do discurso a tirania do regime deposto”. Deste discurso se alimentam hoje os “históricos” da revolução, num povo insubmisso mas obediente com uma direita desempenhada e uma esquerda ultrapassada a viver dos cartazes e punhos cerrados, do funcionalismo público, de um sindicalismo jacobino, do jornalismo educado e até mesmo de intelectuais distraídos. 

O discurso confessional de um Abril (primavera para os mais iguais), com as suas jaculatórias de “fachos”, “imperialistas”, “fascistas”, “ditadura” , a ponto de tanto ser repetido, ganhou foros de verdade, aquela verdade trágica que impede uma análise séria ao novo regime e legitima a sua corrupção (em nome de um bem ou de um mal esconde-se a própria maldade): uma sociedade que vive a fugir do seu passado ou só a apostar no “progresso” é traidora e desonrada, porque desconsidera a sua mãe prostituta para se meter com outra na cama, sentindo-se honrada só por se cobrir com os cobertores da igualdade, fraternidade e liberdade.

 “Quais são os maiores pulhas e hipócritas? os monárquicos ou os republicanos? Eu estou na situação do burro de Buridan para o dizer.” Em resumo: „Enfim anarquia, indisciplina e estomago”.

Fala ainda dos “criminosos esbanjamentos da fazenda pública, destas sindicâncias que se iniciam e nunca se acabam, destes escândalos em que uns e outros se atiram punhados de lama e donde ninguém sai para a cadeia”… como se estivesse a falar hoje de políticos, juízes, banqueiros, PPPs e de cargos políticos ou de seus boys na economia

Concluindo

Na descrição de Humberto Delgado, cidadão condecorado em Novembro de 1957, com a Grã-Cruz da Ordem Militar de Avis, demarca-se a explicação e protesto contra uma mentalidade medieval estática (muito embora compensada por uma dependência incomparável das modas) que cria e repete uma situação nacional de contínua frustração e desengano, transmitida historicamente por partidos e pela governação. 

Somos uma sociedade mais perita no tratamento dos sentimentos do que no lidar com os fatos; é manifesta a falta de experiência da argumentação e de sentido da realidade.

Mais que uma História de Portugal ou uma história da revolução temos uma História de figurinos, que se repetem. O problema de ontem que Humberto Delgado descreve – um país demasiado pequeno para engordar demasiados barões republicanos - é idêntico ao de hoje (se observamos a história dos partidos e dos governos de Portugal a partir dos meados do século XVIII e em especial do século XIX, nada mudou qualitativamente, nada se aprendeu, os mesmos figurinos só se repetem em nome do cinismo glorioso da liberdade). As oligarquias portuguesas são muito intelectuais mas são burras, não aprendem, só se repetem e justificam no seguimento do jugo estrangeiro.

Por um lado somos um povo com reminiscências guerrilheiras lusitanas abafadas e por outro lado somos um povo demasiadamente amarrado ao destino e ao fado, sempre pronto a criticar pessoas mas desinteressado na análise e na crítica dos factos, e actuando segundo a tirânica divisa “negócios são negócios”. As elites foram educadas a só fazer o que a classe “mais alta” espera delas, cada um anda só a um passo de distância do outro mas quer ser identificado por uma diferença que os torne melhores que os outros. Concretamente tanto elites como povo vivem do controlo externo e funcionam em função do exterior; falta um ideal, um objectivo e uma missão que os une e atraia.

A receita para sairmos da entropia e de tal fadário seria, por um lado, distanciarmo-nos da herança muçulmana que vive de uma filosofia de afirmação das incompatibilidades - atitude do emaranhado antagónico - pronta a ver a culpa (responsabilidade) sempre fora e, por outro lado, passar a assumir uma postura de compromisso que inclui o rectificador da dúvida, instrumento do pensamento europeu, que nos livra da certeza calcinante e possibilita o desenvolvimento e a mudança numa dinâmica inclusiva e não exclusiva.

Portugal, tal como o povo israelita, a caminho através de um deserto agressor, precisa de readquirir um ideário e um consenso nacional. Quando se abdica do ideário ou da fé entram as diferentes correntes que em redemoinho desorientam o povo. Daí a necessidade de se permanecer sempre em jogo entre um fechar-se e um abrir-se, de modo a o novo não se independentizar mas a ser integrado e renovar o já possuído.
António da Cunha Duarte Justo
Pegadas do Tempo http://antonio-justo.eu/?p=3499

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