terça-feira, 5 de outubro de 2010
INTEGRAÇÃO DOS IMIGRANTES NA EUROPA: UM PROBLEMA MUÇULMANO
Sarrazin provoca uma Tempestade na Opinião Pública alemã
António Justo
As turbulências em torno da pessoa de Thilo Sarrazin e do seu livro“Deutschland schafft sich ab” (A Alemanha abole-se a si mesma) não parecem querer amainar. Sarrazin, ex-ministro das Finanças do Estado Federado Berlim, trata, no seu livro o tema da integração dos muçulmanos nas sociedades para onde emigram, de maneira demasiado clara e indiplomática. Um assunto mantido tabu pela classe política, pela opinião publicada e pelos intelectuais vem manifestar a divisão dos alemães.
As Teses de Sarrazin
Os problemas da integração “situam-se exclusivamente nos migrantes muçulmanos… e isto deve-se ao fundo cultural islâmico”; situa-se “ evidentemente na cultura do Islão”.
É de opinião que a sociedade alemã se estupidifica mais, nas próximas gerações, pelo facto da classe alemã alheia à cultura e dos muçulmanos migrantes gerarem mais filhos, diminuindo assim o potencial intelectual da sociedade anteriormente liderado pela classe média.
Segundo o autor “os turcos na Alemanha geram o dobro das crianças do que corresponderia à sua percentagem na população”. “Os Turcos invadem a Alemanha tal como os ‘kossovares’ invadiram o Kossovo: através duma quota de natalidade superior”.
Vê na procriação muçulmana fecunda “uma ameaça ao equilíbrio cultural da Europa…e representa um risco para o modelo cultural europeu”. Segundo o relatório 2010 da Conferência dos ministros da educação dos estados federados da Alemanha, nas grandes metrópoles Frankfurt, Munique, Colónia e Estugarda, mais de metade de todas as crianças até aos três anos tem base migrante.
Sarrazin lamenta a baixa quota de turcos dispostos a aprender bem a língua alemã prejudicando assim a própria carreira escolar que se reflecte no facto de 54% dos turcos entre os 25 e os 36 anos não terem concluído a formação profissional. Os resultados das escolas alemãs nos estudos comparativos de PISA baixam devido ao insucesso escolar dos turcos na Alemanha. Sarrazin receia assim a diminuição do quociente médio de inteligência da sociedade alemã baseada na vontade procriadora da classe mais baixa. Parece desconhecer porém os factores ambientais. Os turcos certamente não serão mais estúpidos que os outros imigrantes. Estudos provam um nível intelectual inferior das crianças turcas mas não que sejam mais estúpidas.
Com montes de estatísticas apresenta a tese de que os turcos, com muita emigração para a assistência social alemã, “certamente não contribuíram para o nosso bem-estar”. Atesta que “em todos os países da Europa, os migrantes muçulmanos custam mais do que a mais valia económica que trazem”. (Redução da pessoa ao valor económico!)
O autor best-seller atesta e testemunha com números o que o povo pensa.
Contrapõe o direito do Estado “a decidir ele mesma quem quer receber no seu país ou na sua sociedade” ao abandono deste direito aos partidos.
O tema da integração muçulmana (sua resistência à integração) passou a dominar a floresta das folhas dos jornais. Uma Alemanha, que integrou milhões de polacos nos finais do século XIX e 12 milhões de desterrados depois da segunda guerra mundial, sente-se impotente perante 4 milhões de muçulmanos no país. Atrapalha a Alemanha o facto destes parecerem, na sua grande maioria, contentar-se com a aliança da religião e o vínculo familiar, levando uma vida em contraposição e à margem do país acolhedor. O facto dos problemas da França com os seus 5,5 milhões de muçulmanos é visto pelos alemães como um problema consequente da colonização francesa. Cala-se que a economia moderna explora de maneira agressiva os autóctones da classe média e baixa e os migrantes.
O pluviómetro da excitação atingiu alta densidade e não parece haver lugar para uma aberta. Uma opinião pública pautada pela norma da boa educação correcta e pelo tabu social, em que “sobre estrangeiros ou se fala bem ou não se fala”, acorda estremunhada e revela não ter resultado contra o medo sub-reptício da balcanização da sociedade.
Reacção da classe política ao livro de Sarrazin
As elites reagiram com nervosismo e irreflexão: exigiram a sua expulsão da direcção do Banco Alemão e a sua expulsão do partido SPD. A liberdade de opinião é um bem a cultivar enquanto se não se pertence à classe privilegiada!... A direcção do partido quer expulsá-lo mas a base compreende-o e mais de 2.000 cartas foram recebidas na central do partido. 90% eram a favor de Sarrazin.
Os políticos temem o escândalo duma realidade que se quer silenciada. Não admitem que um dos seus questione o pensar correcto que é o dogma hodierno das classes dirigentes. Daí a necessidade destas em desacreditá-lo e em declará-lo como apóstata. Conseguiram afastá-lo da direcção do Banco Alemão mediante a sua indemnização duma pensão vitalícia farta, evitando assim perder um processo em tribunal.
O Povo apoia-o e as chefias dos partidos atacam-no. Com a sua crítica, ele atinge o sistema partidário que em vez de o discutir o ataca a nível pessoal. Na sua repulsa primária, a política distanciou-se ainda mais do povo já em dissidência da política (por este andar, o partido dos não votantes atingirá os 40%). Na Europa, cada vez mais se assiste a reacções histéricas entre políticos e povo. Numa sociedade em que as elites se desintegram cada vez mais do povo, estas não querem reconhecer Sarrazin nas suas fileiras nem um povo que exige vontade de integração aos muçulmanos.
A má consciência política relativamente ao problema da imigração faz-se sentir numa campanha concertada contra Sarrazin, uma crítica virada apenas contra o seu estilo e ignorando a realidade do conteúdo. Mais uma vez se misturam alhos com bugalhos.
Na espiral dum silêncio político envenenado surgem fendas que se tornarão munição para campanhas eleitorais. Segundo prognósticos estatísticos, se Sarrazin fundasse um partido receberia 20% de apoiantes.
As teses provocantes através das quais Sarrazin escreve no álbum dos partidos o fruto da sua negligência no que toca à imigração turca, que sob o manto da reunião familiar passou de 750 mil turcos para três milhões, deixarão rasto profundo na sociedade. 3 milhões de turcos, em grande parte, vivendo em guetos e em torno das suas mesquitas, com os piores resultados escolares em termos comparativos com outros migrantes e com manifesta falta de vontade de integração metem medo a muito alemão que se sente atraiçoado pela política e vive com a impressão que a classe política não protege o próprio país nem a própria cultura e se coloca ao serviço de egoísmos e oportunismos individualistas ou de classe.
O medo e o oportunismo têm muito poder numa sociedade habituada a varrer para baixo do tapete o lixo que produz e os problemas não resolvidos desde os anos 60. Assim o CDU/CSU e Liberais fecharam sempre os olhos aos problemas, no que tocava aos estrangeiros, vendo-os apenas como mão-de-obra barata que vinha solucionar os problemas duma economia em expansão. Os Verdes cresceram sob a bandeira dos estrangeiros e o SPD apenas se preocupou em integrá-los no partido, atendendo ao potencial que significam em termos de votos para o futuro.
Sarrazin, embora político, não gosta do jogo preferido dos políticos: o Pingue-pongue; gosta mais de futebol! Quer ver a bola na baliza ao exigir medidas vinculativas para a integração dos muçulmanos no país.
Do facit da discussão fica a impressão que os alemães preferem continuar a falar alemão macarrónico com os estrangeiros, não tolerando que Sarrazin, o povo, fale alemão claro. Este descreve um estado de facto mas num tom exaltado e metendo, por vezes o pé na poça. E os seus críticos abusam do moralismo ‘multiculti’ para encobrir os próprios erros e para disciplinar ideias da direita. O problema em aberto é que os políticos passam e os problemas ficam.
Depois da campanha contra Sarrazin os partidos parecem voltar à normalidade começando agora a pronunciar-se por uma discussão aberta e falando da necessidade de integração.
Europa em efervescência
Thilo Sarrazin provoca na Alemanha uma discussão que já se vai fazendo sentir noutros países europeus. A Holanda que nos anos 80 era modelo nas medidas de acolhimento e apoio aos imigrantes manifesta agora com reacções xenófobas que o seu latim chegou ao fim.
Por toda a Europa se sente um fervilhar inquieto no povo. Este vê a pobreza a imigrar para a Europa e sente-se mais depauperado pelos próprios Estados onde as leis e os impostos asfixiam cada vez mais o cidadão. Uma insatisfação cada vez mais explícita contra o agir da classe política estabelecida terá como consequência a formação de novas forças políticas. A crise económica e financeira leva os perdedores da sociedade a revoltarem-se contra as elites que cada vez mostram mais desprezo pelos de baixo.
As camadas média e baixa da sociedade sentem-se inseguras num momento em que a União Europeia, as famílias partidárias e a sua burocracia se tornam mais fortes.
Os problemas económicos cada vez mais reais, a esterilidade das mulheres europeias e a resistência muçulmana à integração e correspondente vontade procriadora levam muita gente a sentir o Islão como uma ameaça à própria cultura.
Muitos constatam que os explorados de ontem reagem agora – via imigração e procriação – explorando as leis existentes, a liberdade de religião e a providência social, levando uma vida em gueto em torno das suas mesquitas e afirmando-se contra a sociedade acolhedora. Emigram para fugirem à desumanidade social dos países de origem mas temem os valores da nova sociedade.
Entretanto o estrato social inferior autóctone descobre-se como parte da classe social multi-étnica precária entregue a uma concorrência selvagem. Por outro lado uma classe secular vê na atitude muçulmana contra a emancipação, contra o indivíduo e contra o iluminismo uma ameaça às conquistas republicanas. Vê-se confrontado com uma religião eminentemente política sem política que a confronte. A força ideal reage e aproveita os fracos do poder económico.
A raiva do povo nunca foi boa conselheira mas a incúria política não pode continuar a ser a resposta a problemas a resolver agora, em termos bilaterais.
Os “populistas” terão sucesso porque os nossos políticos revelam menos inteligência do que o Povo em geral.
“Deutschland schafft sich ab” é um livro incómodo para alemães e muçulmanos. O livro reflecte a opinião do povo, a opinião dos que mais sentem os ventos fortes e frios do turbo-capitalismo. Em relação aos outros estrangeiros e seus descendentes concorre para uma discussão mais adequada, uma vez que a imprensa alemã estava habituada a tratar os problemas especificamente turcos sob o manto de “problemas dos emigrantes e seus descendentes”.
Ressentimento por um lado e arrogância pelo outro não resolvem o problema. A integração do mundo turco e árabe na Europa é demasiado complexa para se poder solucionar com simples posições de pró e contra.
Nem a xenofobia nem a arrogância das elites resolverão os problemas de pessoas oprimidas económica e/ou culturalmente. Em tempos de crise todos tendem a sobre-reagir! Na casa em que não há pão todos ralham mas ninguém tem razão!
Na nossa sociedade em ebulição é de preferir um inimigo verídico do que um amigo falso.
António da Cunha Duarte Justo
antoniocunhajusto@googlemail.com
Subscrever:
Enviar feedback (Atom)
6 comentários:
Caríssimo:
A chamada "invasão pacífica" muçulmana é um facto, embora na Alemanha seja mais patente, também existe em Portugal.
Não vale a pena "fingir" que não vemos, pois eles estão aí.
Resta saber até quando vão permanecer pacíficos, como é o caso, em Portugal, onde a maioria provém das antigas colónias, com os guineenses à frente.
A integração bem pensada pode ser o caminho certo, mas creio que a liberdade de constituírem mesquitas e outros locais de culto do islamismo terão de ter reciprocidade nos países islâmicos onde impera a intolerância religiosa.
Naturalmente que a União Europeia deve ter um plano conjugado com os governos dos seus vários países europeus e terá de agir e a meu ver quanto antes.
Claro que eu não disponho de certezas nem sei adiantar soluções, mas é altura de pensar, sem intolerãncias, mas sem facilitismos.
Não vale a pena esconder a cabeça na areia como a avestruz.
Parabens pelo post e um forte abraço.
Infelizmente, este é um tema quentíssimo e actualíssimo, que muitos, especialmente os parasitas dos nossos políticos, não querem ver.
Aos poucos, muito subrepticiamente, o mundo árabe começa a ocupar antigos territórios, que outrora ocupou e donde voltou a ser expulso, procurando alterar as estruturas e costumes dos povos no meio dos quais se instala.
H.O
Este tema preocupa a humanidade desde o passado.
Lembremos o grande drama dos Judeus imigrantes no Egipto no tempo de Moisés.
Chega a hora de a Humanidade reflectir o assunto na perspectiva das Leis Universais que são invioláveis e imutáveis.
É urgente reflectir o assunto na perspectiva do Sentido da Vida.
O que é o Homem no contexto universal?
Os meus cumprimentos
j.S.
Caríssimo
Professor António Justo,
Antes de mais, quero parabenizá-lo pelo excelente e actual artigo que coloca à nossa reflexão.
Na realidade, começa a ser preocupante a atitude dos poderes políticos no que concerne em encontrar vias de solução para este tipo de problemas. O seu sistemático e irresponsável adiamento poderá conduzir-nos a situações bem mais graves e conflituosas...
Aproveito para recordar, aqui, a atitude assumida pela Austrália. Radical e objectiva, mas uma solução pragmática: Quem quizer permanecer em território australiano tem que se sujeitar ao seu "modus vivendi" e sistema político e, sobretudo, a respeitá-lo. Quem não quizer acatar essa exigência / generosidade, é imediatamente convidado a abandonar o país.
Certa ou errada, é uma solução pragmática e justa!
Lá diz o velho ditado: Cada um em sua casa é rei.
Assim sendo, quem vai para um país de acolhimento, muito naturalmente, terá que se adaptar e integrar na sociedade de acolhimento. Em circunstância alguma, deverá ser a sociedade de acolhimento a subalternizar-se perante estrangeiros...
O mais importante, isso sim, é que o país de acolhimento não se recuse a recebê-los, segundo as suas regras e cultura, o que, à partida, atentos os seus problemas específicos, significa compreensão, tolerância e solidariedade.
Tanto quanto eu a entendo, a globalização tem os seus limites, mas não pode pôr em causa valores seculares, próprios de nações organizadas e com as suas culturas específicas.
Tilo Sarrasin teve a coragem de colocar o dedo na ferida e, como tal, teve a resposta imediata, sobretudo, dos partidos políticos políticos oportunistas, que se traduziu na perseguição obstinada que lhe foi movida, coartada que foi a via do diálogo...
Os parlamentos e os governos deverão definir com rigor os parâmetros em que se desenvolve o acolhimento a estrangeiros - as suas próprias regras, em ordem a que não sejam minados "por dentro" por interesses que transcendem o acto de acolher estrangeiros, muito menos, conflituar com os cidadãos natos desses países.
Aqui, lhe deixo o meu mais fraterno e afectuoso abraço.
Paulo M. A. Martins
Fortaleza (CE) - Brasil
Turks make up the largest minority in Germany. Statistics from 2006 show 1.7 million residents of Germany are Turkish nationals. Including those acquiring German nationality by birth or naturalization, the Turkish community totals 2.4 million in a population of 82 million.
Encontrei isto na net.
Afinal qual será mesmo o número de turcos na Alemanha. Eu pensava que seriam uns 4 milhões. Serão menos?
Abraço
Os quatro milhões e tal dizem respeito aos muçulmanos na Alemanha.
Segundo a estatística do Ministério do Interior alemão, na Alemanha, há 3 milhões de turcos e 330 mil imigrantes de estados árabes. Naturalmente que há muitos turcos com nacionalidade alemã e com dupla nacionalidade o que pode justificar diferentes maneiras de contar. Uma certa imprensa de língua inglesa, muitas vezes, está interessada em apresentar comparações desfavorável aos alemães ou comparando a imigração para a Europa com a DA USA, o que não é legítimo atendendo ao diferente procedere!. Quando se fala de problemas de integração o problema é em geral dos muçulmanos
O problema não só é alemão mas brisantemente europeu. O povo alemão é paciente mas discute muito e profundamente as coisas.
O tema da imigração tinha sido declarado já como falhado, há anos atrás pelo Chanceler Schmidt quando já não no activo. Ninguém se atrevia a falar abertamente porque os interesses económicos da Alemanha na Turquia são mastodônticos e os árabes (muçulmanos) em termos de religião são internacionalmente solidários. A Alemanha, como o motor económico da EU e com uma economia integrada em todo o mundo não pode falar abertamente de certos problemas. Neste caso em prejuízo da Europa. Agora vê-se obrigada a fazê-lo porque precisamente da mais alta elite, Sarrazin cometeu o “erro” de apontar para a gravidade do problema. A Elite não pode aceitar que um dos seus se vire para o precariado, dando-lhe oportunidade para falar com autoridade!
Interessante que a visita do presidente alemão à Turquia meteu o dedo na ferida.
Um cordial abraço e sempre ao dispor.
António Justo.
Enviar um comentário