quarta-feira, 7 de setembro de 2011

Ecossistema Cultural – Biótopo cultural

Opinião formada no Desvio da Verdade
António Justo

Nos meus escritos emprego a palavra biótopo/ecossistema não só no sentido botânico mas alargo-o à antropologia e à sociologia dum lugar ou região (assim, ecossistemas = unidades de vida de várias espécies em comum abrangendo também o seu habitat humano cultural). Assim também a língua faz parte dum ecossistema cultural, tal como o verde faz parte da cobertura vegetal.

Um ecossistema cultural é um processo de organização da vida resultante do ambiente geográfico/climático e cultural. De facto a mitologia, a filosofia, a religião e a maneira de organizar a vida e o pensamento depende primária e intrinsecamente da geografia/clima e da maneira como o ser humano reage técnica, emocional e intelectualmente ao seu meio.

Os conjuntos dos ecossistemas biológicos e culturais encontram-se numa relação de “diálogo” entre si: numa relação biológica e intercultural. Ao falar de ecossistema/biótopo cultural quero sugerir a interdependência e a coerência vital dentro dele mesmo; interdependência baseada no princípio de colaboração/ selecção interna e de definição em relação ao externo/estranho.

Assim como os biótopos e ecossistemas formam a biosfera também os ecossistemas culturais (civilizações, línguas, culturas) formam a esfera cultural humana global. Habitat geográfico e cultural implica a configuração geográfica e intelectual com diversos biótopos. Assim verifica-se que o homem do deserto desenvolve uma filosofia diferente da do Homem das terras férteis. Daí também as diferentes mitologias. A sobrevivência afirma-se na diversidade.

Geralmente, no diálogo entre disciplinas, culturas, ideologias e as épocas da História, não se tem em conta a coerências dos “ecossistemas”, afinidades e diferenças, nem se respeita a lei fundamental que se verifica a nível biológico e cultural: a lei da complementaridade subjacente ao desenvolvimento. Na discussão pública, geralmente um afirma-se negando ou denegrindo o outro. As cores do arco-íris são reduzidas ao branco ou ao preto, ao verdadeiro ou ao falso desprezando-se a realidade que se encontra nas cambiantes.

A afirmação duma opinião própria dum biótopo afirmada em relação a um outro ou a um outro ecossistema cultural pode tornar-se fatal se não se tem em conta as correlações a eles inerentes. Assim a filosofia cristã só pode ser compreendida em relação a outra se tivermos em conta não só o espaço geográfico que ocupa mas também as suas fontes semitas, gregas, romanas num determinado processo histórico. A religião islâmica não se poderá conhecer sem o seu pano de fundo: o oásis e o deserto.

Também se torna arrojado falar-se e ajuizar dum ecossistema linguístico/cultural medieval em termos de ecossistemas linguísticos/culturais contemporâneos. Ao fazê-lo, geralmente, atraiçoa-se não só a cor local mas corre-se também o risco de instrumentalizar mentalidades para fins menos nobres. Até a transposição de textos ou comportamentos medievais numa linguagem corrente hodierna pode induzir em erro. O mesmo talvez já não fosse tão grave se a tradução fosse feita para árabe, uma cultura que se encontra bastante próxima da medieval e como tal com compreensão aferida à idade média. Geralmente, juízos de valor sobre o passado não passam de desculpa duma mentalidade que sofre do mesmo mal da de ontem, hoje criticada.

Na actualidade temos suficientes áreas propícias à discussão sem precisarmos de recorrer ao passado e perturbar o repouso dos mortos, por muito bons ou maus que tenham sido. Quando os argumentos não valem apela-se à responsabilidade clã. Neste sentido, hoje a Igreja Católica é o bombo da festa.

A opinião resulta dum biótopo geralmente em contraposição a um ecossistema.

Não há raciocínio isento. Isenta poderá ser a procura. Na procura crescemos! Por isso vale a pena procurar e raciocinar. O que fica da verdade é a procura e a esperança de a encontrar.

António da Cunha Duarte Justo
antoniocunhajusto@googlemail.com
www.antonio-justo.eu

Sem comentários: