quinta-feira, 19 de outubro de 2017

A VOZ DO PRESIDENTE NUM ESTADO FRÁGIL GOVERNADO POR FRAGILIDADES


No Rescaldo do Segundo Pedrógão Grande (64+42 mortos)


António Justo
Desta vez as labaredas dos fogos, juntas ao silêncio dos seus novos 42 mortos, acordaram o Presidente Rebelo de Sousa, levando-o à província onde a vida se sofre e sente (Oliveira do Hospital); aqui pediu contas aos governantes, com um discurso iluminado.

Numa hora em que já não chegam os sentimentos para governar a nação, Rebelo de Sousa constatou: “O certo é que a fragilidade existiu e existe e atingiu os poderes públicos e exige uma resposta rápida e convincente”; Marcelo quer a humanização da política portuguesa; talvez demasiada exigência para um Estado habituado a dar abrigo aos seus boys e a deixar o povo na rua!

Costa pode continuar descansado, Rebelo de Sousa não é Sampaio!

O aviso do Presidente não pode ser motivo para a direita empolar nem para a esquerda se responsabilizar; num habitual regime de amigos, o Estado é meio e não fim. Pedro Siza Vieira, consultor do governo, velho colega de faculdade de António Costa, passa a novo ministro adjunto e o confrade Eduardo Cabrita assume o MAI. Costa pode continuar descansado, Marcelo não é Sampaio! 

A fumarada sempre existiu, apenas iludida por alguns outonos soalheiros num entardecer já demasiado longo que as labaredas dos fogos vêm pôr mais à vista. A Geringonça só foi possível contra o voto maioritário do povo, num parlamento espelho de um país demasiadamente virado para uma esquerda de tradição jacobina. Este país é muito equilibrado, não gera criminosos só suspeitos.

Os fogos seriam uma trágica oportunidade para o povo português conseguir maior equilíbrio político e cultural. Uma sociedade que só gera extremismo de um lado do hemiciclo parlamentar terá de continuar sempre a mancar e nas pausas a olhar para o ar, à espera que melhore o tempo!

Uma política, a jogar entre Estado e povo, com um António Costa às fintas entre governo e parlamento não oferece sustentabilidade criadora de futuro; a confiança não se gera com palavreado, embora o inconsciente português sinta que “com papas e bolos se enganam os tolos”. Um Estado adulto não poderia servir o país baseando o seu atuar em compromissos de interesses partidários sem que os partidos estabeleçam um compromisso com o povo.

A esquerda radical portuguesa pode atuar descansada; sem adversários, basta-lhe falar de uma ultradireita, só presente na sua fantasia, para justificar a real existência do radicalismo de esquerda (em psicologia, a este fenómeno, chama-se projecção!). A esquerda moderada vai-se aproveitando bem deste fenómeno, pois até dá a impressão de sere um conglomerado temperado representante do centro popular. 

Num país político, de consciência sem pesos nem medidas, a culpa vive num beco sem saída e a responsabilidade também; não é o sentido de responsabilidade que o orienta e desculpa, mas a consciência política embotada de um estado de graça garantido pela culpa (dívida) sempre coberta por um Estado em estado sem cobertura, mas que serve de para-raios a quem se instala debaixo dele. Mas a vida é assim: o poder não se merece, apanha-se e a maioria ainda não notou isso.

Entre o sobressalto da tragédia e as insónias de sonhos de um futuro fumegante, o presidente acordou e falou para um povo sonâmbulo de ouvido surdo e olhar vidrado numa música distante. 

António Costa não pode varrer a casa porque só tem o cabo da vassoura, a vassoura encontra-se no Parlamento. O problema é que a Geringonça, com o seu parlamento, quer ser esquerda responsável e esquerda radical ao mesmo tempo.  
António da Cunha Duarte Justo

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