Da Negligência política no Lidar com o Direito Constitucional
António Justo
O ser humano
começou por ser nómada e continua nómada; corresponde à sua natureza o
esforçar-se para encontrar o seu caminho e melhorar a sua vida; para o seu
desenvolvimento, sociedade e indivíduo precisam de locais desprotegidos e, ao
mesmo tempo, do sentimento de protecção e acolhimento que lhe confira
identidade.
A pessoa precisa
de uma certa paroquialidade e, numa reacção primária, refugia-se, muitas vezes,
no patriotismo e, no pior dos casos, no nacionalismo (fanatismo
religioso/nacional). Enquanto o patriota reconhece o outro como parte (com
características comuns), o nacionalista concebe-o puramente como outro (como
estranho, aquilo que o separa) para assim justificar a violência.
Surgem então fenómenos como fanatismo, racismo, xenofobia, antissemitismo,
etc., da parte das minorias e das maiorias. Estas e aquelas, movidas, apenas
por ligações emocionais, esquecem a regra de ouro da ética: para assegurar o
meu bem trato-te bem! Por isso torna-se necessária a intervenção da razão que
procura fazer do desigual, igualdades, servindo-se para isso dos direitos
humanos. A emocionalidade torna-se num problema comum à sociedade acolhedora e
de acolhidos e mais ainda em relação aos muçulmanos por se definirem, muitas
vezes, não pelo comum, mas pela diferença.
Muitos
muçulmanos que vivem no gueto não querem pertencer à sociedade de acolhimento
embora o possam. Na Alemanha, alunos muçulmanos recusam-se a participar em
viagens escolares de informação (visitas de estudo) a campos de concentração,
alegando que isso “não era a sua história” (Cf. Cícero 6, 2017). Uma
socialização antissemita e a influência dos radiodifusores árabes e turcos
contribuem para o ódio aos judeus e questionam o direito à existência de
Israel. Em 2016 houve 470 incidentes antissemitas em Berlim. Esta cidade, pode
considerar-se o barómetro indicador dos problemas inerentes a sociedades
multiculturais.
Depois de muitos anos de uma política de
integração centrada em desviar o olhar da realidade, junta-se uma sobrecarga de
conflitos principalmente na juventude muçulmana cada vez mais presente nas
metrópoles europeias, até
ao ponto de produzir terroristas nascidos na Europa (1). Esta política do
olhar desviado é responsável pela desestabilização dos partidos na Alemanha e
tem facilitado o aumento alarmante do antissemitismo e da xenofobia na Europa.
Também a tolerância de espaços livres à direita e à esquerda possibilitam
viveiros de violência. O tema xenofobia e antissemitismo torna a sociedade cada
vez mais dividida. Em vez de fazer dos refugiados políticos e da pobreza bodes
expiatórios dever-se-ia reconsiderar e impedir, através da ONU, a exploração
dos recursos minerais da África sem que parte da riqueza fique lá.
Atendendo à
crescente violência, o Estado não deve fugir ao dever de motivar activamente os
novos cidadãos à integração (Na Suiça os imigrantes fazem um “contrato de
integração”: devido à política muçulmana do gueto, muitos imigrantes
provenientes doutras culturas são atingidos aqui por leis que para eles não
seriam necessárias). O problema não está nos muçulmanos, mas nas suas
organizações cientes do poder que a sua massa tem, se reunida em torno da sua
doutrina. Daí a necessidade de toda a simpatia para com os muçulmanos e todo o
rigor com as suas estruturas de poder na sociedade acolhedora. Buschkowsky,
prefeito do distrito de Berlim, diz numa entrevista (HNA 30.01.2012):
“Precisamos de uma imigração convencionalmente estruturada. A imigração não é
uma operação de ensaios para o sistema social. Ela deveria fortalecer, inspirar
e enriquecer a sociedade”. Daí a necessidade de medidas específicas dos
governos no sentido da sua integração; torna-se abusivo falar-se
indiscriminadamente de integração e dos estrangeiros quando a maior parte dos
problemas vêm de grupos muçulmanos. Da experiência que tive em 30 anos na
Alemanha posso afirmar que as culpas não se situam no povo, mas sim nas
autoridades e responsáveis do lado alemão e do lado muçulmano.
Se a religião
não reconhece o humano e a vida como um elemento de orientação primordial,
então o Direito civil deve intrometer-se. Enquanto o Islão se definir como
nação (hegemonia cultural), não deixará de ser ameaça para as nações onde
entra. O direito a fronteiras territoriais e culturais é ancorado na
necessidade de se definir e faz parte da essência da identidade. Apesar disto é
preciso ganhar uns e outros para uma sociedade tolerante comum.
Uma Europa
que, para os seus cidadãos, baseia o direito e a moral na dignidade da pessoa
humana e por outro lado permite, no seu meio, para outros cidadãos, a definição
da pessoa, não por ela mesma, mas pela cultura (direito cultural árabe), entra
em contradição consigo mesma e põe em risco o seu sistema democrático e o seu
direito constitucional. Proporciona a contraposição de uma cultura contra outra
de maneira sub-reptícia. Neste grupo não se trata de servir a dois
senhores (o religioso e o profano) mas de disponibilizar toda a vida ao serviço
de um só senhor: o Islão que é ao mesmo tempo religioso e profano (religião e
política) e como tal prescinde da dignidade e liberdade humana, pois acima do
direito humano é colocado o direito cultural islâmico (por isso na convenção
dos direitos humanos a Liga Árabe se reserva uma interpretação diferente dos
mesmos!).
Assim como
existe uma cultura portuguesa, francesa, alemã, europeia, há naturalmente uma
cultura muçulmana, judaica, chinesa, etc., que se devem respeitar
reciprocamente e serem respeitadas por todos e em que uma não se deve definir
pela exclusão das outras (superior ao direito de uma cultura ou sistema, deve
ser considerado o direito da dignidade humana).
Em bom português
costuma dizer-se: “À terra onde fores ter faz como vires fazer”! Adaptar-se sem
renunciar à dignidade humana e àquilo que a sua cultura tem de nobre. O direito
que rege a nação acolhedora deve ser válido para todos no respeito pela
individualidade de cada um.
Uma sociedade
que permita uma obediência ao Corão em contradição com a Constituição (emprego
da sharia) não ajuda os crentes muçulmanos nem os cidadãos em geral, porque
legitima a discriminação da mulher e atrasa o processo de “desenvolvimento”
humano e social. Em Israel, há, contudo, tribunais de Sharia e de outras
confissões que também são permitidos com o argumento de que “só” negociam
disputas culturais e religiosas.
O exagero no
liberalismo cultural ao tolerar tribunais islâmicos (Sharia), como acontece no
Reino Unido, torna-se, por outro lado, num obstáculo à igualdade dos sexos
dentro da mesma sociedade ocidental e fomenta a desautorização da moral e das
leis. Alice Schwarzer é clara: "Quem coloca o amor aos estrangeiros sobre
os direitos das mulheres torna-se cúmplice dos perpetradores".
Uma tal prática
reconhece então, a nível institucional, o direito de adiar, ad infinitum a
integração com a correspondente reconhecimento dos direitos humanos de
igualdade e liberdade. Deste modo monopoliza-se, a nível de cultura e impede-se
práticas ao nível dos cidadãos, mais dispostos a compromissos de tolerância
entre os cidadãos do que entre cidadãos e instituições.
Grupos de
interesses facciosos estão empenhados em canibalizar o tema como se a
tolerância se pudesse definir numa tolerância de direita e numa tolerância de
esquerda ou numa tolerância de imigrantes e numa tolerância de autóctones. Um
“dogma” comum deveria ser a defesa da dignidade e da liberdade humana
independentemente das fronteiras culturais. A dignidade humana, a liberdade, a
igualdade e o respeito pela vida são os pressupostos para uma vida social
comunitária e os únicos garantes de desenvolvimento.
Nem o sentimento
coitadinho nem a arrogância prepotente podem tornar-se em padrões de análise
dos problemas sociais. Um islão que coloca o Homem sobre a mulher e que
legitima a discriminação da mulher tem de ser reformado e os políticos podendo
obrigar políticos a renunciar a padrões de desenvolvimento adquiridos em nome
do respeito pelo islamismo.
O autor Thilo
Sarrazin adverte: “Para se conseguir uma política bem-sucedida, são
insuficientes padrões morais ".
Quem
reconhece o direito cultural sobre o direito da pessoa humana justifica, já de
princípio, o racismo, a discriminação, a xenofobia, o antissemitismo e a
colonização.
© António da Cunha Duarte Justo
Teólogo e
Pedagogo
Pegadas do
Tempo, http://antonio-justo.eu/?p=4575
(1) A tradição islâmica na sua
doutrina continua a dividir a população do mudo em dois blocos: a Casa do Islão
(„dar al-islam”) onde se professa o Corão e o direito islâmico e a Casa da
Guerra („dar al-harb “) onde a ordem islâmica tem de ser instalada através do
„Dschihad “(Sura 9,29). Como revela a Sura 30,30, o Islão é a religião
original, que na sequência da criação pretende tornar-se a religião de toda a
humanidade usando mesmo da força da espada (legitimação do terrorismo e dos
mártires islâmicos). Isto leva os muçulmanos a interpretar o que lhes é alheio,
como obstáculo e como adversário contra o Islamismo (o conflito entre a
Sérvia e o Kosovo e Albânia foi interpretado não como conflito
entre etnias mas como conflito dos cristãos contra o islão, embora o ocidente
cristão tenha intervenido contra a Sérvia de conotação cristã e em favor dos
muçulmanos). Judeus e Cristãos podem manter a sua religião dentro da ordem
islâmica (pagando impostos especiais e na condição de discriminados). Também há
a Casa do Contrato (dar al-`ahd), “regiões com as quais a Ummah Islâmica assina
contratos temporários”. As duas casas encontram-se numa relação de inimigos. No
islão clássico há apenas normas islâmicas para a relação do Estado islâmico com
indivíduos não-muçulmanos e com estados com o objetivo da sua submissão ou sua
incorporação na ummah (comunidade muçulmana)".
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