À procura do Pai no Universo
António Justo
A 13.10.2014 a nave Philae acometou,
depois de dez anos de viagem, em Tschuri. O cometa desloca-se a grande
velocidade, a uma distância de 5000 milhões de km da Terra.
O objectivo do projecto espacial é
analisar a composição do núcleo do cometa, a temperatura, e a natureza do seu
solo, para, deste modo, se conseguir informações sobre a origem do sistema
solar.
A nave de desembarque Philae (1),
como o nome indica, revela o esforço por decifrar o texto do universo, numa
tentativa de descobrir a origem do cosmo e da vida.
Como pode a técnica do homem (brinquedo
dele), por meio dela, descobrir Deus no seu brinquedo que é o Universo?
O projecto é arrojado; é como
tentar encontrar o Espírito divino, no provisório
do tempo (no corpo morto de Cristo). A intenção é útil e o projecto também, porque,
para lá das diferentes velocidades a que andam as inteligências humanas, o
facto reúne-nos a todos no encruzamento do espaço e do tempo, naquele
entremeio/intervalo, onde começa o nevoeiro interstelar feito de mistério. Aqui,
para lá de constelações e opiniões, encontramo-nos todos no início da mesma
viagem.
Na experiência do universo, tal
como na da ressurreição, o tempo pára, a vida flui, só se ouvindo o ecoar do divino
por todo o universo - um eco no coração do Homem a repetir-se na eterna pergunta:
Pai, onde estás?
Na repetição desse eco outros
ecos se ouvem no receio de uma resposta órfã vinda da técnica para
filhos órfãos, na sombra da vida… Os cientistas permanecem presos em
campos magnéticos, em distâncias e em conjecturas que partem de um pressuposto
próprio. De facto um deus que se pudesse atingir não seria Deus. O que está por
trás de tudo isto e tudo puxa e ordena, não lhes interessa. Cada um, cada criatura encontra o que
pretende, parece também isto ser uma lei da natureza. O homem moderno corre
o perigo de se dissipar no útil e factual perdendo a capacidade de sentir o
pulsar de um poder superior na natureza.
Entre Deus e a sua obra corre o
fluido do nada calado, a deixar espaço para perguntas a que o acaso ajuda mas não
responde. Onde se encontra o eterno tecelão, que, da sua fantasia, fia a vida com
os fios duma ordem misteriosa e perturbadora, de tal modo ordenada que se perde
a meta e o sentido?
O desamparo do Homem, na procura
do Pai (das origens), gira na órbita entre dúvida e convicção. A decifração da
vida precisa não só da luz fria da razão mas também do calor da fé. Doutro modo
a vida gelaria ou seria reduzida a um pesadelo num palco obscuro que em vão
tentaria coar o brilho do Sol.
Neste mundo tudo gira na procura
de uma meta! No emaranhado dos movimentos, a fé gera asas que o ateu não tem. A
viagem da sonda Rosetta, materializa a fé da ciência na procura dos sinais da
vida, tal como a viagem da fé, na procura do sentido do sentido, tenta dar
sentido ao sonho que a vida é.
Todos, no mesmo espaço, viajamos
em diferentes velocidades e órbitras mas num sentido comum de um céu estrelado
com as energias das leis da física, da moral e da razão, tudo alinhado no
seguimento das pegadas do mistério no universo. Todos nós, indivíduos e
culturas, estamos na nave Philae.
Cada época, cada cultura, cada
pessoa tem o seu centro de gravidade – o seu Sol - em torno do qual giram
sentimentos e pensamentos que determinam uma acção própria no decorrer do mesmo
empreendimento de desenvolvimento e descoberta.
Philae perdeu as forças, esvaziou
as baterias depois de dois dias. Resta-lhe esperar pela luz do Sol que lhe
carregará as baterias para seguir a viagem da esperança.
Procuramos nos testemunhos da
órbitra do tempo o que se encontra fora dessa órbitra. A procura é para o homem
o que é para a sonda a velocidade da nave.
Na vivenda do mundo
A nave Philae
Com coragem vai
Em busca do Segredo
Na Sala de Parto
À procura do Pai!
António da Cunha
Duarte Justo
(1) Pedra de
Roseta é um fragmento, em três línguas, descoberto em 1799 no Egipto e que,
juntamente com a descoberta de um outro fragmento, na ilha Philae, possibilitou
a decifração dos hieróglifos egípcios.
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