VAMOS NACIONALIZAR A REVOLUÇÃO PARA LIBERTARMOS A LIBERDADE ABUSADA
Por António Justo
O Espírito democrático entrou pelas
portas da sacristia e da caserna; agora seria chegado o tempo de o
deixar livre sem os empedernimentos factuais e ideológicos; precisamos
de todos, da direita e da esquerda, de crentes e não crentes. Um
Portugal adulto não pode manter-se em contínuo ajustamento de contas nem
num medir de forças adolescentes numa atitude de abuso e de ilusão do
“eu é que tenho razão, eu é que tenho a solução”.
Somos um país demasiado pequeno para podermos continuar a dividir e a combater uns aos outros. Já Confúcio constatava: “Se não há consenso sobre os fundamentos, é inútil fazer planos em conjunto” (1).
Daí a razão de constituirmos, depois do Renascimento, um povo indefeso
sempre à mercê dos ventos das ideologias do tempo. Do pão preocupa-se o
estrangeiro! O pão amanhado pelo povo não chega para manter os gandulos
da nação que, como a cigarra, vivem do seu cantar e deste modo obrigam a
nação à eterna condição de pedinte, como se constata principalmente a
partir das Invasões Francesas!
Vai sendo tempo de se reconciliar
Portugal e de se dar início a um discurso político integral, de
afirmação pela complementação e não só pela contradição e difamação.
Continuar a política nas pegadas do passado seria continuar a sacrificar
o destino de um povo ao desejo insaciável de alguns egos insatisfeitos.
Embora a revolução tenha sido feita pelos soldados não é legítimo metê-la na caserna da esquerda (2); há que nacionalizar a revolução para libertar e dignificar a liberdade abusada. O
Regime de Abril não é propriedade de ninguém; não se reduz a Abril nem a
Novembro; o que temos devemo-lo, primeiramente, aos soldados e a um
povo habituado a apoiar e a seguir, de cabeça baixa, quem se põe à sua
frente. Temos de abandonar o hábito de povo a viver dos ardinas
da praça pública, dos ardinas jacobinos que passam a vida a vender
ideologias engomadas e bem penteadas para só eles viverem das cabeças
distraídas pelas artimanhas dos seus penteados (3).
A censura do Estado novo e uma sociedade
fechada tinham mantido o sistema de Salazar com todas as virtudes e
defeitos que lhe eram próprios (4). Depois começou a haver
brechas na Igreja e especialmente a partir do Concílio do Vaticano II
revolucionou-se o mundo; O movimento eclesial anterior ao Vaticano II
(não notado pelo poder secular) foi decisivo no reconhecimento dos
sinais dos tempos e na fomentação da coragem que depois se expressou no
movimento 68 e finalmente no 25 de Abril.
Actualmente o povo encontra-se
desiludido e desconsolado mas não é contra a democracia, é apenas contra
as casernas da maçonaria e dos partidos. O autoritarismo, a
censura e o dirigismo não ficaram apanágio do Estado Novo, eles
continuaram de maneira feroz mas refinada no Regime de Abril, através de
um dogmatismo ideológico de monopólio da verdade, de uma censura
transformada em tráfico de influências e da tesoura na cabeça de muitos
pensadores, jornalistas e políticos; esta censura discreta e suave foi
conseguida e inteligentemente instalada através de um dirigismo
ideológico de uma esquerda radical infiltrada nas estruturas do Estado
através dos saneamentos em todos os lugares chaves do Estado (5).
Fomentou-se uma sociedade a viver de falsas esperanças, uma sociedade
de fanatismo informal, de saber jacobino e farisaico. Enfim, tornamo-nos
numa democracia à primeira vista, uma democracia oportunista que faz do
Parlamento o lugar alto para os galos da nação. Esta situação não deixa
ninguém acordar para o acordo do entendimento entre todos como seria de
desejar! Assim Portugal é condenado a continuar a viver, abaixo das
suas possibilidades, naquela “apagada e vil tristeza” dos vencedores
encantonados em moralismos sem razão. Assim, a elite de Abril tirou a inocência e a alegria à nação; já ninguém tem vontade de cair no engodo do cantar: “somos livres”!
O factor segurança e a mentalidade de se
“ter o rei na barriga”, tanto no velho como no novo regime, estabelecem
a resistência à mudança de uns e de outros, sendo estes os factores do
eterno adiamento de Portugal.
Resta a todos libertar a
liberdade da velha censura da PIDE e da nova censura do Tráfico de
Influências do ABRIL. Este será o caminho para nacionalizarmos a
revolução e assim libertarmos e dignificarmos a liberdade abusada.
António da Cunha Duarte Justo
Pegadas do Tempo: http://antonio-justo.eu/?p=3556
-
1- O nosso actual “governo geringonça” é a melhor prova de abuso e oportunismo ideológico a ditar leis às costas do povo – sem pré-anúncio programático nem discussão pública – enfim, um governo a actuar pela calada da noite num povo sem telhado nacional!
-
2- Ramalho Eanes foi a personalidade chave da revolução; ele dirigiu o 25 de Novembro.
-
3- Os pensionistas e os funcionários do estado representam 80% da despesa do Estado! A revolução não obedece a uma política elaborada. Era fruto de ideologias encabeçadas por pessoas como Otelo (Brigadas Revolucionárias) e por pessoas do PCP. Álvaro Cunhal aterrou então em Lisboa com orientações de Moscovo e Mário Soares de França com orientações do Ocidente.
-
4- Abrilistas recalcados esquecem que Marcelo Caetano já tinha iniciado uma política aberta que conduziria ao desenvolvimento que outras nações europeias depois também conseguiram sem a necessidade de uma “revolução” nem a consequente subordinação a ideologias que vivem da divisão do povo e da razão, atando-os a uma a uma só lógica enganadora.
-
5- Também por isso os festejos do 25 de Abril se tornaram rituais institucionais que se celebram a si mesmos à margem da realidade da nação. Festeja-se Abril nas costas de 10 mil combatentes mortos no “ultramar” e de quase um milhão de retornados explorados e injuriados e de povos das colónias abandonados à fúria de algumas forças revolucionadas. Não se trata de querermos um revisionismo histórico mas de que Portugal encare a realidade de olhos abertos para integrar no seu ideário sucessos e fracassos.
1 comentário:
Interessante.
O senhor me esclareceu sobre alguns fatos relativos à Revolução dos Cravos. No Brasil, assistir a alguns anos um filme português que retratou esta revolução. Entendo que foi um grande divisor de águas nos rumos de Portugal.
Saudações,
Vilson
In Diálogos Lusófonos 26.04
Enviar um comentário