Impulsos para uma discussão honesta sobre o Islão
António Justo
A falta de
transparência numa discussão torcida
Dizer que
«Alcorão não apela à guerra, mas à justiça» como faz o Xeque David Munir (Imã da Mesquita de Lisboa, e com
explicações eufémicas sobre o apelo do Corão à violência) é torcer e
esconder a realidade literal e factual da linha oficial islâmica; uma tal
afirmação sobre muitas suras do Corão faz lembrar um recurso a frases do tipo
de interpretação das Sibilas sob inspiração de Apolo! Entre a objectividade das
frases do Corão e uma interpretação individual (não oficial: o islão não
permite anotações interpretativas ou explicativas do Corão) esconde-se a
realidade das intenções numa confusão sempre oportuna, à margem das obras que
se praticam; em tempos modernos, o recurso à ambiguidade como maneira de se
desenvencilhar de situações embaraçosas não ajuda os muçulmanos nem os
interlocutores.
Naturalmente, um
público pouco informado dá-se por contente com o primeiro aperitivo que se lhe
apresente para alimentar a mente. Já vai sendo tempo de entrarmos num
diálogo sério e com exigência, num encontro de olhos nos olhos de modo a
deixar-se o estilo de discurso de subterfúgio e a atitude amaneirada e
diplomática dos nossos salões de discussão. Isto adia o desenvolvimento do
islão e apenas serve o negócio dos diferentes funcionários, interessados em
ajuntar públicos mal servidos, ao serviço de diferentes grupos de interesses
(numa união enganadora subterfugiada no uso do pensamento politicamente
correcto) que têm medo de discussões de alto nível filosófico, teológico,
sociológico e antropológico e como tal sem lugar para controvérsia. Não há
lugar para a controvérsia porque os grupos de interesse não estão interessados
na verdade que interessaria ao indivíduo e ao povo.
É também para admirar a vontade de uma
sociedade do mainstream meramente ouvinte e de boca aberta na escuta de
explicações que nos distraem e desviam do mundo dos factos que determinam o
nosso viver e o de gerações futuras.
David Munir
conhece certamente o princípio islâmico da Hudaybiyyah (método de enganar e
obter vantagens). Esta
tradição assenta no tratado de paz assinado por Maomé em Hudaybiyyah e onde
este se compromete a não atacar a cidade de Meca por um período de dez
anos; os representantes de Meca confiaram no acordo feito com Maomé mas este
aproveitou-se da confiança dos adversários no acordo para se preparar e assim
poder atacar Meca com sucesso; passados dois anos, atacou Meca que em 24 horas
venceu completamente, porque inesperadamente atacada. Este proceder de Maomé
passou a ser um princípio da estratégia de guerra para o islão (O mesmo
princípio aliado à Taqiyya constitui, como se vê da História, a tática de
comportamento adaptado por minorias islâmicas enquanto vivem numa sociedade em
minoria: como exemplo bem próximo temos o Kosovo e a Albânia).
Yasser Arafat, assinou o acordo de Oslo com
Israel em 1993 para receber terras dos Judeus. Passados 8 anos quebrou o acordo
(nem esperou 10 anos) e declarou a segunda revolta em 2.000, causando uma
imensa confusão. Arafat conseguiu apaziguar alguns adversários que
inicialmente estava contra o contrato, dizendo “Lembrem-se de Hudaybiyyah”!
Enganar e
obter vantagens é também o outro princípio islâmico da taqiyya que consiste na prática da simulação
(fingir a mundivisão), consiste, em casos embaraçosos, em dissimular a própria
crença religiosa e em poder usar da mentira desde que isso sirva o Islão ou o
crente! O princípio da Taqiya assenta na Sura 3:28, que diz: "Os
crentes não devem tomar os incrédulos em vez dos fiéis como amigos. Quem faz
isso já não tem nenhuma comunidade com Deus. É diferente, se estiverdes na
frente deles (ou seja, os descrentes) e se tiverdes realmente medo deles”. A
amizade com não muçulmanos só é justificada em caso de medo! Outras suras
justificadoras da Taqiyya: Sura 49:13 e Sura 16:106
Uma mera
tentativa de explicações do Corão para pessoas não muçulmanas, querendo interpretar
a palavra jihad e outros solicitações do Corão à guerra e ao assassínio em nome
de Alá, como algo descontextuado, vai contra a realidade muculmana e
corresponde a lançar poeira sobre os olhos dos ouvintes, dado essa
interpretação (que implicaria uma abordagem histórico-crítica) não ser
praticada nos países islâmicos e continuar a não ser assumida pelas lideranças
islâmicas. É preciso ter-se muita confiança sobre si mesmo e ser-se muito
insensível à realidade dos factos para se conseguir passar a mensagem de que o
islão é uma religião da paz. (O que não quer dizer que ele não tenha em si
também potencialidades para se tornar numa religião da paz!)
A compreensão e
o desconto que se pede para os apelos à violência nos textos sagrados islâmicos
seriam de compreender se no islão fosse permitida uma abordagem que admita a
análise histórico-crítica (que tivesse em conta o contexto humano e cultural da
época e a pessoa de Maomé) e possibilitasse uma visão literária e não apenas
literal dos textos (refira-se aqui, em abono da verdade, que também há algumas
seitas cristãs que interpretam toda a Bíblia à letra; os seus estragos não são
tão grandes porque se reduzem a grupos pouco numerosos e que não se afirmam
como gueto). O que o Corão, a Sharia e os ensinamentos de Maomé precisam é de
uma abordagem que lhes permita não continuar a interpretá-los hoje como se vivêssemos
no contexto de Maomé. De resto muitos referentes do islão vêem-se obrigados a
fazer uma apresentação enganosa de muitos textos.
Que os
muçulmanos ajam como agem não é de admirar porque a sua estratégia de afirmação
de grupo tem resultado em benefício da expansão islâmica, o que é de estranhar
é o facto de pessoas formadas no espírito iluminista abdicarem das capacidades
de discernimento e do espírito de procura da verdade em benefício das boas
maneiras. Quem não for
amigo da verdade também não serve como amigo do Homem.
Islão sem
reforma é um engano para a ocasião
Quem for amigo
do islão estará certamente interessado na sua reforma porque só desta forma ele
poderá sobreviver ao saber da juventude muçulmana e contribuir para a paz no
mundo.
Já não chega
defender-se os interesses da religião ou da política, chegou a hora de se
colocar a pessoa humana e o cidadão em primeiro plano independentemente das
suas crenças ou tendências. A dignidade humana não pode ser posta de lado por
muito amor e respeito que se possa ter por uma cultura ou religião. Só
apresenta caracter de sustentabilidade a instituição que defenda os interesses
do Homem que se expressam na inviolabilidade da dignidade humana e na sua
liberdade. Sim, até porque Deus, na compreensão cristã, encarnou no Homem,
independentemente da sua crença numa relação de amor que cria comunidade.
Isto de se
querer apresentar exteriormente um islão vestido à maneira ocidental é um
engano duplo ad intra et ad extra. Um engano para os de fora porque se faz
dizer aos textos o que eles não dizem e que as autoridades islâmicas
consequentemente impedem de dizer ad intra e é também um engano ad intra porque
impede uma verdadeira discussão entre os funcionários do islão.
De facto estes
são os mais perigosos porque são contra um islão moderno – um euro-islão em
construção como alguns muçulmanos na Alemanha e não só. O muçulmano Prof. Dr.
Bassam Tibi já confessou ter de capitular da visão de um islão humanista
europeu porque vê que a política e a grande maioria das instituições europeias
promovem um “islão de lenço na cabeça” um islão da sharia, só interessado numa
discussão de um islão torcido a viver da dúvida e da insegurança dos outros.
Para que o Corão
seja entendido e compreendido como código de vida para os muçulmanos modernos,
os funcionários do Islão terão de começar por permitir o acesso
histórico-crítico aos seus textos e deixar de os aferir e interpretar à maneira
de Maomé (profeta e guerreiro) sem atender à revelação divina através da
História e dos tempos. Naturalmente, o Corão ao pretender ser tido na sua
leitura como a inlibração de Deus (Alá) impede qualquer interpretação liberal.
A Verdade não
se encontra só no caminho caminhado
Naturalmente,
não é possível eliminar as limitações humanas dos textos nem da História; pior
ainda seria se permanecêssemos presos nelas. Assim também não é possível
eliminar o preconceito da sua interpretação, atendendo às conotações da
inspiração que cada época faz na sua interpretação como reacção à necessidade
de se alinhar numa narrativa aberta mas coerente.
Cada pessoa,
cada sociedade precisa de um certo enquadramento que lhe dê identidade e
expressão própria e neste processo de identificação surge o problema dos
caixilhos porque pretendem delinear as fronteiras da verdade quando ela é uma
realidade sem fronteiras. Aqui se situa o problema do preconceito e a tática da
confusão como maneira de se afirmar. O preconceito fundamenta a pretensão de se
possuir a verdade no caixilho da própria visão ou entendimento. O Corão e o
Islão pretendem-se como a verdade absoluta e derradeira da História humana,
cometendo assim o equívoco de identificar os confins da verdade com a cultura
árabe. Este comportamento verifica-se ainda hoje na prática das sociedades
muçulmanas que consideram as minorias como seres de segunda ou terceira classe.
(Porque não exigem os funcionários islâmicos da diáspora os mesmos direitos
para as minorias que vivem nos seus sistemas como exigem para os seus crentes
na diáspora; porque não se manifestam os representantes do islão na diáspora
contra as barbaridades que seus irmãos cometem na África e na Ásia? – Não o
fazem porque o Corão não o permite, não serviria o islão e o islão é contra a
bilaterada em termos de igualdade de direitos religiosos e humanos).
Também a
necessidade de uma “cidadania integrada, integradora e activa” não pode
implicar uma discussão do faz de conta, pronta a engolir cobras e lagartos,
doutro modo corresponderia a um marcar passo das culturas e abdicar do
chamamento de todos à verdade (para lá dos enquadramentos culturais) a que toda
a humanidade está chamada, em nome do desenvolvimento, a ver o mundo como um
tecido comum que todos tecem. Só o conhecimento e o diálogo franco e aberto
proveniente da diversidade religiosa poderão fomentar uma sociedade de alta
competência, diversificada e oleada pelo respeito mútuo, sem cair na
necessidade de se impor gato por lebre.
A preocupação da
política pela igualdade e pelo equilíbrio dos grupos a agir no tecido social
não deveria impedir um diálogo que para ser profícuo terá de seguir as regras
do velho discurso da controvérsia. O respeito de uns pelos outros e o
chamamento à descoberta da verdade não podem deixar-nos alinhar numa realidade
do pós-facto em que a emoção e o oportunismo se tornem como orientadores da
sociedade. A ideia e a procura da verdade são a luz que ilumina o nosso
caminhar.
Continua num artigo próximo que tratará
sobre razões do desinteresse numa discussão honesta e digno sobre o Islão.
© António da Cunha Duarte Justo
Pegadas do Espírito no
Tempo http://antonio-justo.eu/?p=4156
2 comentários:
Tens toda a razão, Justo, mas o David Munir é uma excelente pessoa. O problema é que foi formado no Corão e vivendo como vive no mundo ocidental e conhecendo o humanismo Cristão se dissesse outra coisa teria de abandonar o Islamismo. Daí eles terem necessidade de ignorar e mascarar as partes complicadas do Islão.
Agostinho Santos
FB
É compreensível mas não recomendável tal atitude. Doutro modo nada se desenvolveria no mundo. Como não conhece apenas um sistema dever-se-ia tornar num reformador do islão e dizer, o que segundo a sua consciência não está bem nele, etc. O problema do Islão ao não querer mudar-se tem de mentir e iludir apenas, para não deixar ficar mal o que é realmente mal!
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