O Coração europeu bate nas
Capitais dos Países membros e não em Bruxelas
Por António Justo
O debate Pró-Europa, conduzido pelo presidente Francês Mácron, começa a
ganhar perfil em tempos pré-eleitorais para o parlamento europeu (26 de Maio).
De um lado a França centralista com Mácron e do outro a Alemanha federalista
com Annegret Kramp-Karrenbauer (AKK) que desce ao concreto. Por seu lado, o Ministro
Federal das Finanças, Olaf Scholz, ficou-se pelo geral dizendo: "Emmanuel Mácron
deu um sinal decisivo para a coesão na Europa. Acho que ele tem razão: não é o
cepticismo, mas a confiança que deve determinar as nossas acções."
O plano de ação para a EU, já exibido por Emmanuel Mácron em diferentes ocasiões e
apresentado, por último, na sua carta aos cidadãos da Europa, “Por um
Renascimento europeu” (1) publicada a 4 de Março 2019, já recebeu resposta concreta alemã no Welt am Sonntag 11.03.2019, pela
voz de Annegret Kramp-Karrenbauer (AKK), a chefe da CDU e próxima Chanceler in spe.
Mácron propôs uma europeização dos
sistemas sociais, uma Força Sanitária Europeia,
um Salário Mínimo para toda a EU, um Serviço Europeu de Asilo, um Conselho Europeu de Segurança, um Conselho Europeu de
Segurança Interna, um Banco Europeu do Clima para financiar as alterações climáticas, uma Polícia de
Fronteira Comum e a fundação de uma Agência Europeia para a Democracia e um
Conselho Europeu de Inovação. Pretende
também que se aumentem as despesas militares, reduza as emissões de CO2 a zero
até 2050, 50% menos pesticidas até 2025.
AKK, com uma só cartada,
distancia-se, de Mácron, a nível europeu, e afirma-se como aspirante fiável a
chanceler perante o público
alemão. AKK refelcte as coordenadas da política alemã ao avisar: “Se tivermos
agora a coragem de falar concretamente de alterações aos Tratados europeus, nem
a "elite de Bruxelas", nem a "elite ocidental", nem a elite
supostamente "pró-europeia" devem permanecer encerradas entre si. Só
conseguiremos a legitimidade democrática para a nossa nova Europa se
envolvermos todos no processo” (2).
Até pela forma de discurso se nota a diferença do caracter alemão mais
formiga (nórdico) perante o caracter mais cigarra (3) dos latinos (Sul)!
AKK, ao contrário de Mácron,
quer ver uma Europa construída em duas colunas tratadas com igualdade, ou seja,
cimentadas com o “método da colaboração intergovernamental” (entre governos e
instituições da EU) e o “método comunitário”.
A AKK, no Welt am Sonntag,
rejeitou, em parte, tal propósito argumentando que "o centralismo europeu,
o etatismo europeu, a comunitarização das dívidas, a europeização dos sistemas
sociais e o salário mínimo seriam o caminho errado".
Considera prioritário
“assegurar as bases do nosso bem-estar” prevendo para isso a criação de “um
mercado interno para bancos e ao mesmo tempo construir um sistema de
subsidiariedade, autorresponsabilidade e responsabilidade vinculativa dos
parceiros"; exige a segurança das fronteiras exteriores da Europa e o
Serviço de Protecção das Fronteiras (Frontex) "ser rapidamente convertido
numa polícia operacional de fronteiras." Quando ao serviço Europeu de
Asilo, defende que os requerentes a entrar na Europa, já à entrada nas
fronteiras Schengen, será necessário verificar se se
trata de uma pretensão de asilo, de um estatuto de refugiado ou de qualquer
outro motivo existente. A chefe da CDU exige também um registo electrónico de
entradas e saídas e o desenvolvimento do Sistema de Informação Schengen.
"Cada Estado-Membro deve dar o seu contributo para a luta contra as
causas, a protecção das fronteiras e o acolhimento”. Doutro modo corresponderia à desautorização
da soberania e dos Estados.
Quanto à ideia de Mácron de
haver uma Preferência Europeia em matéria de concorrência (“Punir ou proibir empresas que prejudiquem nossos
interesses estratégicos e valores fundamentais, tais como padrões ambientais,
proteção de dados e pagamentos de impostos apropriados”) haverá concordância entre os dois Estados, porque, neste assunto, os
interesses da Alemanha e da França cobrem-se em relação ao concorrente China;
esta preferência iria prejudicar os Estados membros com menor produtividade
industrial e comercial.
A Alemanha também veria com melhores olhos que no conselho de segurança mundial houvesse um assento europeu em vez
dos lugares franceses e britânicos. Talvez na proposta francesa de se criar
um Conselho Europeu de Segurança Interna e um Conselho Europeu de Segurança
haja espaço para outras conversações. Certamente a Alemanha não aceitaria ficar
sob a dependência atómica francesa e por outro lado pôr a sua economia à
disposição sem contrapartidas. (Em política as ideias são bonitas mas quem pode
pode!)
AKK mostra-se moderna e conservadora, o que a torna mais aceitável no meio
conservador da CDU e da Europa (A sua posição certamente que agrada aos
britânicos que se sentirão motivados a um segundo referendo que os mantenha na
União Europeia).
Uma proposta que parece demasiadamente centralista e até antidemocrática é
a sugestão de Mácron, de se criar uma Agência Europeia de Proteção da
Democracia; para isso deve ser criada uma burocracia que envie peritos
controladores a cada Estado-Membro da UE para proteger as eleições da
manipulação interna e externa (de facto, esta poderia ser usada como máquina de
censura da Internet, etc.). Uma tal instituição poderia também ser usada para
assegurar a predominância das forças do poder político estabelecido (De notar
já a impaciência da classe política e seus submissos, em relação à liberdade de
expressão atual na Internet).
Conclusão
Nas posições de Mácron e AKK
debate-se o centralismo latino europeu contra a tradição federalista alemã e
democrática anglo-saxónica. Para
os alemães não chega a expressão de ladainhas como” solidariedade” e
“comunidade de valores”. Os alemães sabem que primeiro está a jaculatória da
economia e só depois vem a resposta da ideologia e que esta corresponde mais ao
“ora pro nobis” do povo, para consolação cordial! Sem compromissos responsáveis
económicos não se constrói futuro sustentável para a EU. De facto, todo o desenvolvimento quer ser conquistado para passar
depois a ser adquirido; uma vez adquirido torna-se património, mas este é sempre
o resultado de uma política económica inteligente, o que não quer dizer sempre justa.
A Alemanha está consciente do que contribui para que estados como a Grécia
consumam mais do que produzem, conhece a desmesurada Itália com bancos com
créditos podres e sem garantia de confiança, e está ciente do que faz pelos
refugiados rebocados por bandos para a Espanha, para depois serem recebidos na
Alemanha (Destas coisas porém não se fala muito em público senão o povo ainda
se tornaria mais rebelde, ou seja, mais populista!). As soluções não podem ser
esperadas só da Alemanha, mas da conexão das economias nacionais ao nível da
produção e sem que se deixe a cultura europeia à disposição do marxismo
anticultural, como tem estado a acontecer: nem tanto ao mar nem tanto à terra! Os alemães têm medo que não se cumpram as
regras do endividamento das nações e como consideram a Europa como uma espécie
de pátria substituta da sua pátria perdida, querem tudo ajustado a uma Europa
sem nacionalismos, mas sob a batuta da economia, isto é, uma Europa no mundo,
mas mais forte que fraca!
As ideias europeias de AKK são de grande interesse, apesar de virem da
chefe da CDU e não da chanceler; isto é considerado por muitos quase um abuso diplomático (mostra porém a
inteligência dos conservadores alemães na tática de passagem de poderes da
Chanceler Merkel para a sua sucessora in pectore). Ao contrário da chanceler Merkel, AKK, ao exigir que o Parlamento da EU
apenas se reúna em Bruxelas e ao deixar de lado os interesses franceses das
sessões parlamentares em Strasbourg e ao não ligar sequer à proposta de Mácron
de ser fundada uma Agência Europeia para a Democracia e ao contrariar o
fortalecimento da economia europeia pela solidariedade (transfer de bens)
querido por Macron opondo-lhe o “princípio da subsidiariedade e da autorresponsabilidade dos estados-nação” quer uma Europa nova mas que não perca o
cunho do made in gemany.
Annegret Kramp-Karrenbauer (AKK), chefe da CDU vai ocupando o espaço da
Chanceler Ângela Merkel embora a chanceler continue a ter muita aceitação na
população: 67% dos alemães são contra a renúncia ao cargo de chanceler; querem
que Merkel continue no cargo até ao outono de 2021. A chanceler quer por seu
lado que AKK vá ocupando espaço no partido e na opinião pública e por isso
concede à amiga muito espaço para autoafirmação. A hora de AKK decide-se depois
das eleições de maio em Bremen ou nas de Outono no Leste da Alemanha; tudo
depende da reacção do parceiro de coligação SPD.
AKK, com a sua tomada de posição, chamou os bois ao rego e demonstra que a
construção da nova Europa não pode ser deixada ao sabor de meras ideologias e
como tal tem de ser construída no respeito pela velha Europa: quer uma europa
do Sul mas que não perca o Norte!
© António da Cunha Duarte Justo
In “Pegadas do Tempo”, https://antonio-justo.eu/?p=5353
NB. Ver as notas em “Pegadas do Tempo”
(3) A comparação
da cigarra e a formiga refere-se às elites dos países e não ao povo.
1 comentário:
https://quasartechsciencie.blogspot.com/2019/05/europa-atraviesa-la-oportunidad.html
Enviar um comentário