Emigrante: Um Recurso político e económico desperdiçado
A Conotação negativa do Emigrante
Na Penumbra de Portugal o Cheiro a Povo não faz mal
António Justo
Num país exportador de” recursos
humanos” e em que a vida económica é muito enriquecida pelo contributo dos
emigrantes, não parece lógico haver preconceitos contra os emigrantes.
Um certo preconceito conotou a
palavra emigrante de algo “negativo”, algo com cheiro a província, a povo, a tradição,
a fado, e a folclore! Observa-se aqui um fenómeno paralelo ao que se iniciou
com o 25 de Abril em relação a fado, Fátima e futebol; estas eram palavras que
pareciam não ter o cheiro de um curral novo progressivo-burguês. Uma questão já
tradicional dentro de um curral que se vai contentando em mudar de nome.
Quem se arma, em Portugal, não
aguenta o cheiro a povo e até certas palavras têm que ser lavadas com lixivia
para perderem a ocasional má conotação. O inocente da questão está em se
resolver os problemas mudando-se as palavras. Hoje, em vez de se dizer Emigrantes prefere dizer-se “Portugueses
residentes no estrangeiro”; não é bem por snobismo mas pelo aroma académico com
que se quer prendar os novos emigrantes, ou talvez, para não haver confusões
entre o velho e o novo! Antigamente o português saía da terra para fazer
pela vida, por razões de pobreza e pelo facto de a terra não ter lugar para ele
se desenvolver; hoje sai-se da terra à procura duma vida mais digna que a
carência da terra não dá. Antes o povo saía de fugida ou imperceptivelmente, hoje
sai aplaudido pelos meninos duma política, sem pudor, que o convida a emigrar!
O facto é que, ontem como hoje, a emigração faz parte da penumbra de Portugal
onde o cheiro a povo não faz mal.
Os tempos mudaram. Antigamente
Portugal era nosso, hoje já não é. Hoje somos mundo; temos um Portugal menos
português mas mais mundano e bem trajado, numa sociedade de ideias mais
penteadas e alinhadas.
Ontem vinha a província à cidade,
hoje vai a cidade ao mundo, ficando muita gente já não sob os arcos da ponte
mas sob as rodas da máquina. Naturalmente, a saída é uma decisão que não se faz
de ânimo leve porque quem sai deixa muito, encontra a soledade e, se voltar,
não volta o mesmo.
O Contributo do E/Imigrante não reconhecido na Opinião pública
Não há família portuguesa sem um
membro no estrangeiro, sem alguém que não tenha saltado os muros para recuperar
a vida digna que parecia nas mãos de outros (os Media referem cerca de quatro
milhões e meio de portugueses a viver fora de Portugal)! Os portugueses
residentes no estrangeiro são o símbolo da vontade e da aventura, o símbolo de
um Portugal onde a nação não dorme. Ontem como hoje, são estes os melhores
mensageiros de humanidade a espalhar o património cultural e humano por todo o
mundo e a melhorar a qualidade de vida em Portugal.
Segundo relatos oficiais estatísticos
de 2006, por cada dez emigrantes portugueses há um imigrante em Portugal. A importância
do imigrante é cada vez mais relevante também por contrariar o envelhecimento drástico
da sociedade portuguesa. Agora Portugal sente-se
de rosto erguido por se contar entre os países importadores de pessoas que
procuram uma vida mais digna.
A opinião pública portuguesa ainda teima em ignorar o emigrante, ou em
recordá-lo como pessoa simples de mala na mão, com cheiro a bacalhau e a fado churrasco.
Os Media falam e com justiça do contributo dos imigrantes em Portugal mas calam
geralmente o contributo dos emigrantes. As freguesias
envelhecem e sangram no êxodo da sua gente nova. Noutros tempos e ainda hoje
muitos emigrantes funcionam como programas de fomento da terra, como
fomentadores do bem-estar, garantidores de biscatos e emprego, de compensadores
de assistência social. No sentido de aproximarem costumes e povos tinham também
uma função parecida à dos trovadores! Mas, no meio de tudo isto, os bancos são os que mais beneficiam com as
remessas tendo em conta o aspecto da sua liquidez e de aplicações.
A diferença de trato de
imigrantes e emigrantes, por certos sectores da sociedade, até se torna
compreensiva atendendo aos interesses das diversas forças sociais nacionais e à
pressão da observação internacional. Enquanto os imigrantes se tornam interessantes
para os partidos, na qualidade de possíveis adeptos, e pela sua potencialidade na
qualidade de votantes, os emigrantes encontram-se longe, descuidando o voto e não
são tão influenciáveis às ondas locais. O grande prodígio da emigração ainda não
acordou para o seu poder. Também as cúpulas dos partidos em Portugal ainda não acordaram
para a sua grande missão de intervenção cívica. A Portugal interessaria uma presença partidária, quer de esquerda quer
de direita, integrada nas constelações e famílias partidárias dos países de
acolhimento! Neste sentido terá de haver uma consciência portuguesa e
talvez algumas das verbas desperdiçadas em honorários de embaixadas e
consulados pudessem tornar-se mais úteis se aplicadas no fomento da integração dos
luso-descendentes na maquinaria do poder dos países de acolhimento. É preciso
motivar a juventude a participar nas estruturas dos partidos e nas iniciativas
cívicas.
A opinião pública tem um grande
défice de informação no que respeita à necessidade de mais informação positiva sobre
e/imigração.
A globalização e o
transnacionalismo fomentam as migrações, o que pressupõe uma consequente
política empenhada na inclusão e também na recepção de imigrantes que não se
afirmem pelo gueto. O momento que a Europa atravessa não é fácil para
emigrantes nem para imigrantes. Em tempos de recessão, o maior combate a uma
economia informal atinge mais duramente uma parte dos imigrantes. Nestas questões
é necessário pensar-se a longo prazo: por muita imigração que tenhamos o défice
demográfico continuará a ser alarmante.
Voltando ao problema do trato dos
emigrantes! Quem vive numa Alemanha pergunta-se: porque é que os emigrantes
alemães não têm conotação negativa na sociedade alemã? Também eles saíram para
melhorar a vida. Porque é que não se nota neles aquele nosso preconceito
burguês do estatuto social como substrato do nosso ser e pensar? Porque é que se pensa no “lá vêm os
emigrantes”, que parecem levar tudo na enxurrada, e não nos turistas
portugueses a dar vida ao mercado? Porque apostar sempre na diferença pela
negativa? O facto de os emigrantes terem a experiências da terra e do
estrangeiro torna-os, por vezes, impacientes, indiscretos e ousados, à frente
dos balcões dos bancos e dos serviços públicos; isto não deve ser o suficiente
para serem olhados de lado! Ou será aquela inveja fina de cara para inglês ver
acrescentada de um espírito burguês a roçagar nas almofadas das cadeiras dos
nossos locutores?
À parte a emigração por razões políticas,
torna-se duvidosa uma acentuação epidérmica da diferença da emigração de há 50
anos em relação à de hoje. Isto torna-se caricato e perigoso porque pretende,
por um lado, fazer passar um certo snobismo português para um campo impróprio e,
por outro lado, desvia a questão dos grandes problemas que estão na base da
deslocação de grandes massas migratórias. A emigração, na sua grande maioria, é
fruto da má organização de estados, da sua incapacidade económica (pobreza) ou
da sua instabilidade política.
Falar de uma Europa sem
fronteiras, também revela memória curta. O grande intercâmbio europeu da classe
nobre e burguesa até ao século XIX, onde havia grande permuta de cultura, não deveria
ser considerado um capítulo à parte. Também então não havia propriamente
fronteiras; os interesses das famílias nobres e do clero abatiam-nas! Hoje a
ditadura da economia só está interessada na permuta de serviços e dinheiro e
despreza a cultura!
António da Cunha Duarte Justo
Jornalista
Livre e Independente
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