A Alemanha dá Exemplos de Democratização da Riqueza
António Justo
Porque deixam as Câmaras Municipais o sector da electricidade nas mãos dos
poderosos?
Democracia bem entendida começa por baixo e implica também a democratização
da produção e da riqueza. Em Portugal, ao contrário da Alemanha, as Câmaras
municipais acabaram propriamente com o serviço municipalizado da electricidade em
benefício de uma política centralista em desfavor das regiões e das
instituições locais. Como indicativo de uma política regional de economia de
mercado social, apresento o exemplo da Alemanha onde, devido à política das
Câmaras municipais, estas arrecadam os lucros obtidos com as energias
renováveis, em vez de verem o dinheiro sair da região para multinacionais. A honestidade de uma política democrática pode
ser avaliada na riqueza das regiões e pelas medidas empreendidas nesse sentido.
O Estado português, em vez
de implementar uma política legislativa punitiva para evitar incêndios florestais,
poderia optar por uma política económica eficiente mediante legislação positiva
fomentadora da produção das energias de biogás, biomassa, lodo de esgotos,
incineração de resíduos de madeira etc., como medida de fomento regional.
Desde 2017 todos
as habitações da cidade de Kassel (204.000 habitantes) são fornecidas 100% com
energia renovável dos serviços municipalizados. Os planeadores entenderam que o
futuro estará nas energias renováveis e na regionalização, dando por isso um
passo decisivo nesse sentido.
Os “Serviços municipalizados Kassel AG” (sociedade por acções S.A.) da
cidade de Kassel conseguem produzir nas suas instalações energia renovável mais
que suficiente para fornecer e satisfazer o consumo de todos os seus agregados
familiares particulares.
A empresa da cidade produziu
em 2017 (um ano) 447 gigawatt horas de energia elétrica ecológica e os habitantes
da cidade consumirem 407 gigawatt horas (407.000.000 quilowatts-hora).
O município conseguiu assim superar os seus objectivos da planificação de
2007 onde se tinha proposto atingir o alvo de produzir 80% de energia renovável
até 2020, como noticia o HNA 19.01.2018. De facto, 66% da energia resulta das suas 29 turbinas eólicas, o resto vem de
energia fotovoltaica (0,2%), hidroelétrica (0,4%), biogás (16,3%), biomassa
(6,8%), lodo de esgotos (0,4%) e incineração de resíduos de madeira (10,5%).
Como as redes de abastecimento
de baixa tensão se encontram nas mãos das Camaras municipais, estas podem fazer
passar a própria energia por elas não tendo de gastar no aluguer das linhas suprarregionais
de média e alta tensão. (No
caso de uma falha haveria sempre a possibilidade de usar energia hidroelétrica
da Noruega.)
Para o fornecimento aos clientes empresariais da cidade, a própria produção
ainda não chega, pois só as empresas consomem por ano 777 gigawatt-horas.
Lamentavelmente, em Portugal não há verdadeira concorrência de produtores
nem de fornecedores de electicidade, por isso, o cliente não beneficiou com a
liberalização de antigos monopólios.
Portugal desfez-se
praticamente dos serviços municipalizados de electricidade em proveito do
grande capital e dos interesses políticos centrais. Uma certa instabilidade política municipal
(rotação de partidos) nem sempre favorece planeamentos a longo prazo (que
beneficiaria o município e os munícipes), mas essa falha poderia ser superada
mediante a cooperação a nível de municípios vizinhos com programas e projectos
que vinculem as Câmaras a longo prazo no que respeita à produção de energias
renováveis, distribuição e venda.
Em Kassel juntaram-se muitos cidadãos que, em defesa da terra, apostaram
nos geradoras eólicas e veem hoje que o investimento local se tornou rentável
para as suas acções e por outro lado têm a satisfação de verem a própria terra
enriquecida, não tendo de pagar os serviços a sociedades monopolistas ou multinacionais.
De facto, os grandes negócios do futuro estão nas energias renováveis e nas
águas.
Colocar os sectores
rentáveis nas mãos dos poderosos só favorece as oligarquias económicas e
políticas a nível central e empobrecem as regiões e paralisam a iniciativa empreendedora local. Empresas semiprivadas, a nível de Municípios
ou de grupos de municípios, tinham a vantagem de favorecer as forças activas da
região e impediriam o favorecimento dos negócios com empresas multinacionais ou
com monopólios nacionais que só beneficiam o centralismo da oligarquia
partidária e económica distantes.
Imagine-se que Arouca e os concelhos do interior começavam a organizar, regionalmente,
sociedades anónimas mistas para fomento de energias renováveis! Naturalmente a
política central teria de criar directrizes estruturais de quadro que
impedissem o monopólio da EDP a nível de
produção, grandes linhas e fornecimento, que, com o tempo, passa para as mãos
anónimas chinesas, etc.
António da Cunha Duarte
Justo
Pegadas do Tempo http://antonio-justo.eu/?p=4672
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