Do Dom Quixote e
do Sancho Pança que somos
Por António Justo
Dom Quixote (é o símbolo
de idealistas, de progressistas, de sonhadores, da cidade e da elite cavaleira
que quer dominar o mundo) é o patrão de Sancho Pança (símbolo do concreto, da
seriedade, da tradição, dos conservadores, da realidade, do povo, amante da aldeia
e da família). O poder dos Dom Quixotes não deixa os Sancho Panças fazer valer
os valores que lhes corresponderia, embora o destino e interdependência sejam
comuns.
O Sancho Pança
segue Dom Quixote na esperança que este lhe dê o reinado de uma ilha que lhe
prometera. Esta é a ilusão que mantém o povo arrebatado e enganado por ideologias,
mas sem as quais também não poderia viver.
A vida é injusta e quem disser o contrário
passa a ser também parte dos idealistas. A virtude é cultivada nos alfobres da injustiça
Facto é que
Sancho Pança e Dom Quixote cavalgam juntos através dos tempos e são
inseparáveis, diria, são complementares!
Aquilo que os Dons
Quixotes de hoje deveriam reconhecer é que a nossa vida é e será o romance e
que a virtude e vida que cultivam é colhida nos alfobres da injustiça!
Vive-se numa sociedade individualista dos Dom
Quixotes, equivocados, ao pensar-se que se consegue gerir a vida sozinhos. A
União Europeia, na sua acção política com as nações, não tem respeitado as duas
personagens que são protótipos inseparáveis, e que pertencem mesmo ao género do
Mito: a expressão da realidade social e individual na sua essência. Também progressistas
lutam contra conservadores como se fosse possível uma vida social sem uns e
outros, além de uns e outros cultivarem a ilusão de que é possível uma
sociedade feita só de Dons Quixotes.
O grande escritor
Miguel de Cervantes com o livro Don Quixote de la Mancha criou uma parábola do
que se passa também no nosso tempo e que supera o tempo histórico (ele é genial e tornou-se em fonte
inspiradora de literaturas internacionais).
O povo aguenta
com o perigo e com os riscos dos sonhos das elites, mas que estas não sofrem. A
ideologia torna-se muitas vezes um impedimento da vida pacata e bem vivida, mas
abana-a da sua pasmaceira. O povo não gosta das intrigas do poder e hoje de
maneira especial não se sente bem com os Dom Quixotes que lhe querem roubar o
sossego da terra e da família.
A nostalgia que
amarra o Sancho povo ao Dom Quixote vem de um certo ideal professado e ingénuo pelo
Dom Quixote bem servido!
© António da Cunha Duarte Justo
Pegadas do Tempo
Sem comentários:
Enviar um comentário