Terror das Ideologias camufladas sob o Pretexto da Religião e da Liberdade
quando a Estratégia é dominar o outro
António Justo
Com o atentado de Paris, o Islão não foi insultado, quem
foi insultada foi a humanidade, a dignidade e a liberdade humana. A instituição
não sofre, quem sofre são as pessoas sejam elas islâmicas ou não. Neste
atentado há vítimas humanas e elas é que se devem recordar e defender. Ao
defendermos o Islão ou Charlie estamos a esquecer as vítimas de um lado ou do
outro. A vida e a dignidade humana é que devem estar no centro da discussão e acima
de cada instituição seja ela religiosa ou secular.
Se libertarmos o
homem libertamos a religião, se defendermos a dignidade individual deste modo
está defendida a liberdade religiosa. Ao defender-se a dignidade
humana como bem superior a tradições e instituições, contribuiremos para um
diálogo construtor de paz, solidariedade e libertação humana e com esta para a
disciplinação das instituições.
Somos uma sociedade com pessoas e grupos a andar a diferentes
velocidades e cada um construindo a sua felicidade na demarcação de tempos e
regiões como forma de sentir o próprio existir; é isto que provoca detritos e
desgastes… o problema vem da afirmação de um em relação ao outro, de se
procurar construir uma identidade baseada na diferenciação cultural e ideológica.
Foi atacado um grande símbolo da liberdade duma França não
só laica mas também jacobina. Foi também atacada a liberdade universal, um
direito humano fundamental muito embora fosse, também ela, símbolo de um tempo
ideológico parado que legitima a própria posição no poder atacar a outra. Na
discussão é manifestamente calada a luta provocante de um radicalismo
esquerdista contra a religião. Se antes o Estado (para desenvolver a própria
identidade se serviu da religião, hoje o estado laico procura afirmar a sua
servindo-se da ideologia materialista ateia) antes era aliado da Igreja hoje tornou-se
em seu contraente aliando-se à ideologia esquerdista secular ateia. A guerra
destes contra tradições religiosas observa-se não só depois da república mas
ganhou força com a centralização do poder em Bruxelas (UE). A europa precisa
naturalmente do vitalismo religioso e secular mas não na contraposição de uns
contra os outros. A “César o que é de
César e a Deus o que é de Deus”, não podendo a ideologia secular açambarcar para
si também o lugar de Deus.
No atentado de Paris, temos aqui dois agressores ociosos
cada um defendendo o seu tempo e a sua geografia, não notando que o espírito
motivador é o mesmo e o dilema está nas diferentes velocidades do mesmo
veículo. Uns foram vítimas do fanatismo religioso, por vezes, encoberto por
representantes e defensores da instituição religião e outros foram mortos em
nome de uma liberdade defensora do regime secular que não para de provocar os muçulmanos
como se viu no Iraque, Afeganistão e norte de África. Violência em diferentes
nomes e com diferentes graus de gravidade encobre a violência escondida entre
exploradores e explorados.
Este atentado irá fanatizar, amedrontar e legitimar
medidas mais controladoras da autoridade estatal em relação aos cidadãos; irá
prolongar o abuso e exagero do mundo secularista contra os heterodoxos do seu sistema;
isto pretendem os extremistas por trás de Charlie, de al Qaida e as elites de uma
preponderância americana, todos interessados em dividir para mandar. A estratégia
é a mesma: numa massa anónima à disposição, uns combatem em nome de Deus,
outros em nome da liberdade ou de interesses económicos.
As leis do Ocidente cada vez se tornam mais apertadas e,
assim, a nossa sociedade se torna cada vez mais igual à deles e protela a consciência
de uma subtil exploração. Enquanto nos distraímos com palavras e não agimos com
boas obras vale tudo usando, uns e outros, como seu melhor meio de autoafirmação,
o ataque.
No meio de tudo isto, o cristão sente-se chamado à
liberdade e à paz, mesmo contra o próprio ponto de vista, mas por outro lado sofre
ao constatar que quem ganha é o violento, porque as massas são conduzidas por
estes.
Portugal terá de
estar atento para se não tornar em lugar de trânsito para extremistas.
Importante será observar os movimentos salafistas e grupos apoiados pela Arábia
Saudita (construção de mesquitas) defensora da corrente fundamentalista
wahabita. Atrás de estabelecimento de relações económicas junta-se
o contrabando de ideologias. Uma premissa nos deve levar à contenção na discussão:
Portugal, com 0,4% de muçulmanos, não tem razão para alarmismos e entretanto o islão
renovar-se-á.
António da Cunha Duarte Justo
Jornalista
www.antonio-justo.eu
(1) Como tudo elabora a sua razão em nome do bem contra o mal, o passo consequente
e imediato é a luta, a luta dos melhores contra os piores; como cada qual só
conhece o miradouro da sua verdade, não há verdade mista, os maus são os
outros. Tudo luta pela sua verdade e pela sua paz e por isso divide a realidade
em duas partes: a verdadeira e a falsa, a boa e a má, a nossa e a dos outros;
este facto faz de todos delinquentes, uns em relação aos outros. A guerra passa
a ter razão porque esta nasce na cabeça; como cada um quer o melhor, torna-se
lógica a luta pela vitória do “bem”.
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