A União Europeia desorientada deita os Cães à solta
António Justo
Os factos
Sem o mencionar, nos bastidores da EU, os países de tradição protestante do Norte
e os países de tradição católica do Sul encontram-se em guerra surdina (A
França como potência do Sul joga dos dois lados). O que acontece é a
continuação sub-reptícia de batalha cultural iniciada no século XVI: uma luta de mentalidades: o Norte mais
empenhado em cuidar da vida e o Sul mais interessado no viver.
O povo do Norte vê os resultados do seu amealhado
destruído pelo BCE e o do Sul sente-se supérfluo ao trabalhar para pagar os
juros das dívidas. O descontentamento vai-se tornando no denominador comum. Então fala-se da formação de uma EU a várias
velocidades, que se concretizaria na formação do grupo núcleo dos países que
apostam num euro forte e do grupo dos países de euro mole. O grupo do núcleo
forte determinaria as regras do jogo e o outro, com um novo estatuto, ficaria a
jogar, mas em “fora de jogo”.
A Europa do Norte foi quem se aproveitou mais da
União Europeia, mas, actualmente, encontra-se num empasse. A Europa do Sul foi
a que mais se endividou. As dívidas e o
problema dos juros a pagar incendeiam os ânimos dos concidadãos de hoje tal com
incendiava em séculos passados os ânimos do povo contra os judeus. Chegamos
ao fenómeno de os aguerridos de hoje nas suas críticas contra o Norte e contra
a EU se encontrarem na mesma atitude dos anti-judeus de ontem. Como já não há
razões comummente sustentáveis, as elites deitam os cães à solta, para assim o
povo se ir entretendo em atitudes de gatos encrespados perante o perigo.
O fenómeno actual
Com a explosão dos refugiados na Europa inicia-se a era do tempo pós-facto, o tempo
em que no Estado reina a confusão e na sociedade a emoção. Simultaneamente
surge o tempo da pós-politica em que a emoção reina em baixo e em cima. O
presidente turco Erdogan tornou-se no acabado exemplo deste tempo da pós-razão.
Neste período a discussão tornou-se popular, tanto em cima como em baixo.
Vivemos em tempos axiais de mudanças radicais, percecionadas como tempo do
pós-facto, da pós-política e que em filosofia se poderia designar de tempo do
pós-razão.
O socialista Dijsselbloem presidente do Eurogrupo
acirrou os ânimos da Europa do Sul numa entrevista ao FAZ de 20.03 onde, com
inveja do viver dos do Sul, diz inocentemente:
“Na crise
do euro os países do Norte mostraram solidariedade para com os países do Sul.
Como social-democrata (socialista), a solidariedade é para mim extremamente
importante. Mas quem a pede, tem também deveres. Não posso gastar todo o meu
dinheiro em bebida e mulheres e depois disso ir pedir a sua ajuda. Este
princípio vale para o nível pessoal, local, nacional e também europeu”.
A ideologia funcional
instalada aproveita-se do lapso de Dijsselbloem para desviar as atenções do
texto para a poesia. Assim não se olha ao conteúdo do que disse, mas fica-se
apenas pela poesia do como disse. É
pena, porque a sanha satisfeita agora no ladrar e no latir é energia que depois
falta para o agir. Nela se consola a política ao ver que o tubo de escape
funcionou e que o povo até levanta a cauda do contentamento na agressão. Esta é uma atitude própria da política
da era pós-política. A política e interesses de grupos políticos conseguem
manter-se e afirmar-se nos acessórios do sentimento sem terem de recorrer a
soluções objectivas e racionais.
O que conta é a conversa, não os factos… O
discurso da mentira e das meias-verdades é cultivado por todo o lado. O povo já
está de tal maneira habitado a elas que acharia incómoda a verdade.
Um descuido, para alguns, do tamanho da Europa,
consegui transformar-se em causa de Estado. A política reagiu como as galinhas
quando, de repente, deitadas à solta.
Jeroen Dijsselbloem ao
perder as eleições na holanda perderá também a gerência do Eurogrupo que tem
até janeiro de 2018.
Numa palavra, o problema não está no que disse,
mas em ter ofendido a fé socialista que prefere a competência em ideologia à
competência em economia. Assim, o Ministro dos Negócios Estrangeiros português
Augusto Santos Silva juntou-se à crítica do líder do grupo socialista MEP
Gianni Pittella que criticou Dijsselbloem arguindo que fez “comentários discriminatórios
que estão abertamente em contradição com a linha da família progressiva
Europeia." O Bloco de Esquerda, como de costume, colocou os óculos “de
racismo, xenofobia e de sexismo”. Como se vê a Europa continua na guerra de fé!
Na era da pós-política, iniciam-se espirais de
reacções sentimentais que substituem a política baseada na análise objetiva e
racional de ponderação de interesses. Os partidos pegam na isca do sentimento
para seu melhor profilamento bastando-lhe, para terem sucesso, atiçarem as
emoções dos que se encontram debaixo de suas mesas.
De facto, “pela
boca se apanha o peixe” e pelo sentimento se apanha o povo!
© António da Cunha Duarte
Justo
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