LIBERDADE A SER
SUBORNADA NAS DEMOCRACIAS LIBERAIS
A
Sociedade europeia aberta autossacrifica-se por negar os Padrões éticos que causaram a
sua Evolução e Abertura
Por António
Justo
A
democracia liberal deixa de oferecer garantias de humanidade e de
sustentabilidade ao produzir uma crescente atitude político-social autoritária
e uma postura de autodefesa autocrata que se serve de medidas legislativas e
burocráticas limitadas a corrigir as desfigurações do sistema. Uma sociedade
vital não pode limitar-se a ser defensiva para o exterior e, ao mesmo tempo, destruir
os padrões que a definem e lhe dão coerência a nível interior.
No
início da era digital reconhecíamos nas novas tecnologias de comunicação e informação
uma grande potencialidade para democratizar a sociedade e víamos nela a
possibilidade de dar também voz aos que não têm voz e, ao mesmo tempo, a
possibilidade de moderar e contrabalançar a demasiada influência de elites
politico-económicas, regimes políticos, hierarquias estatais e privadas na
formação da opinião pública e no desenvolvimento da consciência dos povos. As
instituições, porém, conseguiram ganhar a dianteira domando essas
potencialidades, na consciência de que quem domina a informação tem o cidadão
na mão e naturalmente o poder sobre a ordem estabelecida!
Em particular, não há proteção
suficiente contra máquinas de filtragem e de censura arbitrária de plataformas
de monopólio como Google, Facebook, etc. Além disso, os
direitos civis digitais são relegados para segundo plano no que diz respeito
aos interesses da indústria e do governo.
A liberdade de expressão e a liberdade de receber e
transmitir informações e ideias sem interferência da autoridade pública e privada
é cada vez mais condicionada a interesses de instituições. Mesmo a posição parlamentar sobre o #DigitalServicesAct
(DAS) da EU não satisfaz os direitos fundamentais na rede e transmite parte da
decisão sobre a liberdade de imprensa e de opinião à direcção do Facebook &
Co. A
liberdade de expressão como direito fundamental de importância elementar só
poderia ser restringida pelo legislador e não deixada aos critérios de uma
empresa.
A
esperança de que, com a queda da União Soviética, a democracia liberal seria o
sistema para o futuro, como anunciava o cientista político Francis Fukuyaman,
não se confirma e cada vez deixa mais a desejar.
Entretanto observa-se um maior controlo do Estado com
medidas de intervenção na rede a pretexto da defesa de moral pública.
Naturalmente terá de haver regulação para se impedir a criminalidade, mas sem
que o Estado se promiscue, doutro modo aumenta o processo de entropia da nossa
civilização e amplia a desconfiança num
regime que, cada vez mais, põe em perigo a liberdade social e a democracia ao
pretender construir um monstro com pés de barro.
Liberdade é o
âmago do desenvolvimento humano e da democracia liberal, mas, numa sociedade
aberta de valores meramente abstratos, a elite política reconhece-se incapaz de
manter socialmente a sua liberalidade e por isso já procura comprometer
empresas privadas globais na tarefa política de controlar a sociedade. Bruxelas
tem trabalhado em textos tendentes não só a desconstruir a cultura europeia,
mas também a permitir uma maior promiscuidade entre estado e privado no intento
de diminuir a liberdade do cidadão para mais facilmente mecanizar e
burocratizar a sociedade (a burocratização e a administração devem, ao mesmo
tempo, substituir a espiritualidade da sociedade) a sociedade. Os
nossos tecnocratas decretam já hoje medidas controladoras da personalidade
humana que, pouco a pouco, legitimam instalar entre nós o modelo chinês que
concebe o cidadão apenas em termos de funcionalidade dentro da máquina estatal!
Nesse sentido a máquina de Bruxelas serve-se de agendas devotadas à
desestabilização e desconstrução dos fundamentos da cultura europeia minando
assim os princípios mais elementares da dita democracia (valores vitais como o
da vida e da liberdade começam a ser subjugados aos princípios da
funcionalidade, dado o sistema pretender ser a premissa ordenadora dos
valores).
A política ao ver-se confrontada com grandes problemas
sociais criados pela própria sociedade liberal, reconhece a própria
incapacidade de regular uma sociedade humana orgânica, e, para se desviar do
problema, aposta no centralismo total implementando para tal o controlo digital
da população não tendo sequer escrúpulos em delegar competências de controlo de
caracter público às grandes empresas privadas de comunicação social, como
Facebook, Google, etc ....
Atualmente o baralho (de realidade, opinião e ilusão) é
tal que a liberdade social parece oscilar, como o pêndulo de um velho relógio
de sala, movido por forças sociais já indetermináveis porque a rosa dos ventos
perdeu a orientação ...
Embora todos nós tenhamos direito às nossas opiniões e a
decidir do que é importante na nossa vida e do que é nosso, não estamos isentos
do enquadramento limitativo do direito do Estado e da sociedade em que se vive.
A lógica não tem a última palavra a dizer numa sociedade plural e
multifacetada, (porque exige muitas diferenciações), tendo, por isso de ser
supervisionada pela Razão de caracter mais abrangente do que a ordenação de
factos ou ideias numa linha lógica linear de conclusões inequívocas. O facto de uma
democracia liberal – como a sociedade europeia aberta - ter vantagens, por tentar
dar resposta à questão da diversidade, a liberalidade não a iliba dos problemas
sociais internos que ela mesmo cria e em muitos casos a deslegitimam (imigração
desregrada consequência do poder político-económico imperialista transforma-se
em cavalo troiano dentro da cultura europeia).
Observa-se na sociedade ocidental a
tendência para se insistir na liberdade da heteronomia e por outro lado numa
intervenção cada vez mais directa do Estado contra a autonomia e contra a
liberdade do cidadão assumir responsabilidade pessoal. Muitos
deixaram-se levar na onda contra o presidente dos EUA Trump, o que veio a
possibilitar aos administradores das redes sociais expulsá-lo; aqui o que é
grave é o facto de se constituir um precedente perigoso e o transfer de poderes
do Estado para empresas particulares (este reconhece assim a sua incompetência
própria de regulador isento da sociedade) pondo em perigo o cidadão e o sistema
democrático.
Assim se cria o pretexto de se poder proibir informação
enganosa sem a necessidade de definir o que é enganoso e que parâmetros são
usados para chegar a tal. De facto, a pergunta a ser primeiramente resolvida
seria: assunto enganoso porquê; enganoso de quem e para quem? Considera-se como
factual a informação mais conforme no sentido do regime ou da população e como
fack o que as questione ou que seja realmente notícia falsa com objectivos
escuros? E quem deve decidir sobre o caminho pré-determinado a seguir? O
problema reside na circunstância de muitos factos serem susceptíveis de
diferentes interpretações e de serem ordenados para determinados fins que
alguns poderão querer que o povo siga. Naturalmente também há notícias
construídas, fotos manipuladas, etc. e tudo isso vem complicar a situação, mas
há que estar atento a uma paulatina chinesação dos aparelhos do Estado.
Muitos acusam a liberdade de ser o princípio de muitos problemas (ou de parte
dos problemas) mas aí reside um equívoco porque só a liberdade pode dar
resposta aos problemas que a sociedade vai apresentando: só a liberdade humana
aliada à identidade comunitária chamada a realizar-se e a servir toda a
humanidade no respeito mútuo de cada um pode dar resposta aos problemas do
nosso tempo e não o erro globalizado do liberalismo arbitrário avassalador
deixado às leis do mais fortes numa sociedade considerada mercado de grupos e
instituições que tem criado problemas incalculáveis à construção de um futuro
mais humano. veja-se o poder que
empresas digitais e empresas globais já têm de determinar disposições e preços
sem que os atingidos tenham possibilidade de intervir porque o estado que os devia
defender também é sócio na defesa de interesses e na sua especulação porque vê
alguns dos problemas resolvidos e também recebe os seus dividendos através dos
impostos (quanto maior o custo do produto mais o Estado ganha).
Embora condicionados à morte somos chamados à liberdade!
Querer reduzir a liberdade à mera materialidade ou a um mecanicismo de caracter
funcional e pragmatista corresponde a uma atitude desumana porque faria da
pessoa uma peça; a liberdade e o espírito são o sol que tudo vivifica e estes
pertencem à pessoa e não às instituições; estas só têm relevância pelo serviço
que prestam e pela memória que possibilitam no andar da história.
Nos últimos anos, a liberdade de expressão tem sido cada
vez mais ameaçada, não só por um Estado faminto de impostos e cada vez mais
controlador e colecionador de dados, mas também por actores privados, como
bancos e corporações tecnológicas ao serviço dos gigantes da economia; por este andar chegaremos
a um tempo em que o cartão do banco inutilizará o cartão do cidadão. O controlo generalizado em via e a censura
são males, venham eles donde vierem.
Não é de confiar num Estado zeloso que determine a medida
do discurso político a ser admissível. As grandes plataformas tecnológicas
Google, Face Book, etc., não têm legitimidade para controlar o cidadão e o
Estado, ao conceder-lhe competência para tal, está a demonstrar a sua
incompetência para governar a sociedade que criou e parece estar a tornar-se
ingovernável com meios democráticos; as empresas têm a sua lealdade para com os
seus accionistas porque foram criadas com a finalidade de ganharem dinheiro para eles.
Uma
limitação de liberdade pelo governo só seria justificável se ocasionalmente
limitada no tempo, mas tem de estar sempre sob a pressão crítica de ter de se
justificar perante o cidadão. O
cidadão crítico desempenha uma função importante na defesa das massas de uma
censura indiretamente institucionalizada para reduzir a liberdade de expressão
e de opinião. Mas também é de
compreender a atitude de muito cidadão que, resignado, cada vez se refugia mais
na sua vida privada, como já é de observar em camadas da juventude. A gravidade da situação em que nos encontramos (medidas
Corona e propaganda em relação à Rússia-Ucrânia, etc.) conduz a posições extremistas
e motiva conservadores a defenderem medidas estatais drásticas e move também os
progressistas a defenderem a limitação da liberdade individual e civil como
preço a ser pago para se conseguir progresso ou uma reconstrução social no
sentido socialista.
Na fase do
regimento Corona, a liberdade foi simplesmente subordinada ao valor da saúde e
agora que temos o regimento da guerra na Europa tudo passou a ser condicionado
à segurança (o comportamento assumido por governantes e média e a maneira
indiferenciada como é acatado pela generalidade do povo faz duvidar da
capacidade social para defender a liberdade). Isto é também sinal
da falta de critério e de maturidade da classe dirigente que se comporta de
maneira cínica como dominadora da consciência social e olha só para o momento
sem considerar o futuro. A política ao valorizar apenas valias individualizadas
falha contra o critério que pressupõe o equilíbrio e a referência integral de
todos os valores humanos e sociais a preservar.
Não é suficiente ir-se vivendo nem chegam as ondas
sucessivas criadas na sociedade para dar sustentabilidade a um povo e menos
ainda a consequente atitude relativista de uma democracia liberal limitada a
fazer caminho sem missão nem metas; embora
se tenha a impressão que a democracia
liberal seria o sistema político capaz de dar resposta à questão da
diversidade nas sociedades europeias, a EU na sua ideologia de sociedade
liberalista está a conduzir-nos a grandes problemas porque não chegam o valores
abstratos liberais que os nossos tecnocratas nos querem impor como mundivisão aberta (valores europeus); estes revelam-se
incapazes, de darem resposta a uma vida orgânica existencial de cidadãos e de
sociedade já despojados num globalismo impulsionador de (e servido por)
sociedades anónimas e secretas que, para se afirmarem no Ocidente, se tornam
demolidoras da família, da pátria e de um tecto espiritual comum. O seu radicalismo contra o regionalismo e
contra a província desqualificam as suas pretensas boas intenções de criarem
uma humanidade sob um só tecto universal materialista e sem metafísica.
A liberdade pela liberdade torna-se insustentável porque
levaria a um estado caótico da existência de indivíduos sem instituições nem
órgãos ordenadores. A liberdade manifesta-se como factor dinâmico competidor
entre o indivíduo e as suas organizações institucionais; esta tensão tem de ser
mantida em equilíbrio muito embora pendular.
Creio que o liberalismo democrático, que na qualidade de
ocidentais tanto afirmamos, poderá ter a sua lógica linear como método de
resposta à diversidade de problemas e exigências criadas depois da segunda
guerra mundial, mas, numa ordem globalizante, não resolve os próprios problemas
sociais por ele criados e menos ainda outros problemas existenciais e de
sentido que este liberalismo mercantilista aberto e sem fronteiras cria. Creio
que o problema da razão, nas suas tentativas de alinhamentos lógicos se torna
num pau de dois bicos ao apostar numa narrativa de perspectiva unilateral que
subordina a vida do cidadão ao aspecto utilitário sociológico-político. Sem
abandonarmos a polis teremos de reconhecer a natureza (família, aldeia e regionalismo),
como lugar de vida autêntica e de orientação, doutro modo o globalismo servido
por democracias liberais terá como consequência lógica a criação de governos
autoritários servidos por oligarcas.
António da Cunha
Duarte Justo
Teólogo e Pedagogo
Pegadas do Tempo, https://antonio-justo.eu/?p=7593