quinta-feira, 4 de dezembro de 2025

A PROFUNDIDADE DO ADVENTO

Espera que arde e Esperança que encarna


A Arte de esperar acordado
O Advento não é apenas preparação para o Natal; é a aprendizagem da própria vida. Somos seres em espera,“a mais alta forma de atenção”, como recorda Simone Weil. O mundo, com a sua beleza e brutalidade, escapa ao nosso controlo. Não o podemos salvar, nem proteger todos do erro.
Mas a consciência desta limitação não nos convida à resignação rasteira. Pelo contrário: desperta a sede que nos define. Como dizia Agostinho, “inquieto está o nosso coração enquanto não repousa em Ti”. O Advento começa nesse ponto: na inquietação luminosa.

Deus dispõe… através das nossas Mãos
O velho provérbio, “o homem propõe e Deus dispõe”, não é uma abdicação, mas um pacto. Deus dispõe, sim, mas através daqueles que se deixam enviar. Teresa de Ávila lembra-nos: “Cristo não tem agora outro corpo senão o teu.”
O Advento realiza-se quando alguém decide encarnar o anúncio. Quando alguém, mesmo cansado, acende uma pequena luz. Quando alguém, mesmo ferido, volta a levantar-se.
A esperança começa assim: com gestos pequenos, mas fecundos.

O Incenso e o Fogo interior
O incenso, que tanto associamos ao sagrado, ensina-nos um segredo: para exalar perfume, precisa de arder. Assim também a esperança. Não é conforto suave é fogo que purifica. Requer queimar medos, ilusões de controlo, indiferenças que nos tornam espectadores.
Viver o Advento é aceitar este entremeio vivo: entre contemplar e agir, entre procurar a paz e enfrentar a fealdade do mundo. Bonhoeffer dizia: “Só quem espera pode verdadeiramente agir.”

A Luz que já veio e ainda espera por nós
A Luz já entrou no mundo, mas permanece muitas vezes escondida sob cinzas. A esperança não é expectativa vaga: é convite a que algo aconteça em nós, para que essa Luz encontre passagem.
E alguns, os profetas do nosso tempo, sentem antes dos outros esse tremor secreto, essa brasa escondida. São eles que nos despertam e nos recordam que a espera não está vazia, mas grávida de Deus.

A Título de Conclusão
Conta-se que, numa aldeia de montanha, vivia uma sentinela que todas as noites subia à colina. Nada acontecia, mas ela subia sempre.
Um jovem perguntou-lhe: “Porque vigias, se nada vês?”
A sentinela respondeu: “Não subo para ver. Subo para que, quando a luz vier, não a encontre a dormir e para guardar no peito esta pequena brasa que me aquece.
Chegou a tempestade e a aldeia procurou refúgio na colina. Encontraram a sentinela e a sua brasa, ainda viva. Com ela aqueceram as mãos e o coração.
E compreenderam: a sentinela não esperava porque via a luz, esperava para que a luz a encontrasse desperta.
E a pequena brasa não salvou o mundo, mas salvou os que precisavam dela.
António da Cunha Duarte Justo

Texto completo em Pegadas do Tempo: https://antonio-justo.eu/?p=10451

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